São Paulo, domingo, 22 de junho de 1997
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Ganhos e perdas no câmbio

CELSO PINTO

A facilidade com que o Brasil tem levantado dólares no mercado internacional não eliminou nem as dúvidas, nem a discussão sobre o futuro da política cambial. Ao contrário, nos últimos meses, o próprio presidente Fernando Henrique Cardoso ouviu, de economistas de fora do governo, sugestões que vão da livre flutuação à criação de bandas largas de flutuação do real frente ao dólar.
Há riscos em mudar o câmbio. No entanto, também há o risco de não mudá-lo já e ser obrigado a fazê-lo no pior momento político, empurrado por uma eventual crise externa.
Mexer no câmbio implica afetar toda a política econômica. Como quase tudo em economia, o ganho de um lado pode ser a perda de outro. O economista Francisco Pinto, ex-diretor do Banco Central, acha que manter a atual política cambial é o mal menor. Sua conta de perdas e ganhos:
1) Política atual - embora não haja garantia formal, o governo tem mantido a desvalorização cambial próxima à inflação. Ao mesmo tempo, o BC tem procurado manter o "cupom cambial" (quanto ganha aqui, em renda fixa, um investidor externo) o menor possível.
O piso para o cupom cambial, argumenta Pinto, não é apenas ter um nível de juro que não afaste inteiramente o investidor externo, mas um que não leve o investidor interno a buscar aplicações no exterior. Com a liberdade que existe para a movimentação de capitais, o problema de ter juros excessivamente baixos não seria o de perder os, digamos, US$ 20 bilhões em aplicações externas de curto prazo no Brasil. O risco, no limite, seria provocar a fuga da maioria dos R$ 350 bilhões que existem em aplicações financeiras.
Como existe abundante financiamento externo, tem sido possível manter o cupom cambial em torno de 8% líquidos ao ano. Juros não excessivos significam menos pressão na política fiscal, já que o governo é o maior devedor.
A principal vantagem da atual política é funcionar como uma poderosa âncora contra a inflação. Ela, no entanto, aumenta o risco de um colapso nas contas externas e obriga o governo a segurar a taxa de crescimento para não pressionar as importações.
2) Acelerar a desvalorização - poderia aliviar a situação das contas externas, mas aumentaria a expectativa futura de inflação. Como a desvalorização seria maior, a única forma de manter a remuneração do cupom cambial seria elevar os juros, afetando a conta fiscal e podendo afetar o crescimento.
O risco maior seria o de gerar demandas por indexação, a começar do mercado financeiro.
3) Máxi - o principal risco seria reacender a inflação. Uma máxi de, digamos, 20% não poderia ser absorvida pelas empresas sem repassar nos preços. Mais inflação, por sua vez, poderia ressuscitar a indexação.
O outro risco seria o dia seguinte à máxi. Mesmo que o governo voltasse a uma política parecida com a atual, a percepção de risco futuro no câmbio poderia aumentar, levando a um aumento dos juros. (É bom lembrar, contudo, que os que defendem a máxi sustentam o oposto: ao restabelecer a perspectiva de equilíbrio nas contas externas, a mudança poderia aumentar a confiança dos investidores externos.)
Uma máxi geraria prejuízos às empresas e bancos endividados em dólares, com possíveis custos fiscais.
4) Livre flutuação - criaria dúvidas sobre uma desvalorização e isso se refletiria nos mercados futuros. A forma de manter o cupom seria elevar os juros internos. Se o BC não elevasse os juros, investidores externos e internos tenderiam a sair do país e isso pressionaria o câmbio no sentido de uma desvalorização.
Se o BC sancionasse a desvalorização, incorreria nos custos da alternativa da máxi. Se tentasse evitá-la vendendo dólares, acabaria mais vulnerável e não haveria, de fato, livre flutuação. Se simplesmente elevasse muito os juros para segurar os dólares, prejudicaria o lado fiscal e a economia como um todo.
5) Alargar a banda - se o objetivo real fosse induzir uma desvalorização "de mercado", volta-se aos problemas da máxi. Se não, a ajuda nas contas externas será pequena.
Conclusão de Chico Pinto: existe um risco ao manter a atual política, mas alterá-la agora seria um risco maior.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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