São Paulo, quinta-feira, 3 de julho de 1997
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A Tailândia joga a toalha

CELSO PINTO

O governo da Tailândia finalmente jogou a toalha, ontem, frente à pressão dos mercados nos últimos meses e deixou sua moeda, o baht, flutuar. Aconteceu o previsível: a moeda desvalorizou 20%, apesar do aumento dos juros básicos de 10,5% para 12,5%.
Os bancos centrais da Malásia e das Filipinas tiveram que intervir nos mercados e elevar juros para defender suas moedas. O receio de que a crise não se limite à Tailândia afetou também a moeda da Indonésia. O Sudeste Asiático, paraíso do alto crescimento e da estabilidade nas últimas décadas, saiu arranhado.
O efeito contágio para países emergentes de outras regiões, por enquanto, foi limitado. O fato de os Estados Unidos terem decidido manter inalterada sua taxa de juro foi a boa notícia que contrabalançou o nervosismo vindo da Ásia. A Bolsa de São Paulo acabou fechando em alta de 1,97%.
A turbulência, contudo, ainda não acabou e certamente deixará sequelas. O governo tailandês relutava em desvalorizar o baht com medo de um impacto recessivo. Da dívida externa de US$ 90 bilhões, 70% são de empresas privadas. O sistema bancário, que já estava fragilizado, ficará em situação ainda mais complicada.
A bolsa da Tailândia, que havia perdido cerca de dois terços de seu valor desde o ano passado, acabou subindo 7,9% com a expectativa de que a desvalorização ajude as exportações. O fato, contudo, é que a desvalorização impôs uma pesada perda de capital a quem estava investido no país e aumentou a percepção de risco cambial em toda a região.
Afinal, a Tailândia, mesmo em situação melhor, acabou obrigada a seguir o mesmo caminho do México em 94 e deixar sua moeda flutuar. Ao contrário do México, cujas reservas, no final de 94, tinham literalmente evaporado, a Tailândia ainda tinha mais de US$ 30 bilhões em reservas.
Mais do que isso, quando houve a primeira onda mais forte de ataque especulativo, em maio, os bancos centrais da região (Malásia, Filipinas e Indonésia), se uniram para intervir nos mercados em defesa do baht. O governo tailandês impôs uma série de restrições a operações financeiras nos mercados futuros contra o baht e fez ameaças diretas contra bancos que ousassem apostar contra.
A imprensa tailandesa, segundo a revista The Economist, chegou a publicar que o megaespeculador George Soros estaria apostando contra o baht e que o banco central tailandês iria "destruí-lo". Soros, como se recorda, é o mesmo que ganhou US$ 1 bilhão, em 1992, apostando contra o Banco da Inglaterra na desvalorização da libra. Como se vê, pode ter ganho mais uma vez na Tailândia.
O desfecho do ataque especulativo na Tailândia prova que nenhum dos truques tradicionais, da elevação dos juros à intervenção dos bancos centrais e aos controles cambiais, é uma garantia integral contra um ataque especulativo, especialmente se houver razões de fundamento por trás dele. Os problemas na Tailândia foram se acumulando, com a desaceleração das exportações, no ano passado, o salto no endividamento externo, a relutância em aprovar medidas fiscais mais rigorosas e, principalmente, a pouca decisão com que foi tratada a crise bancária crescente.
O déficit em conta corrente da Tailândia chegou a 7,5% do PIB no ano passado, um nível comparável ao do México em 94 e bem maior do que o do Brasil hoje, de 4% do PIB. Sua dívida externa, equivalente a 47% do PIB, também é bem maior, em termos relativos, do que a dívida externa brasileira, de 23% do PIB.
O alerta, contudo, vale. O Banco Central brasileiro insiste que a combinação de um alto nível de reservas e a disposição de colocar os juros na lua poderá contornar qualquer eventual ataque especulativo contra o real. A Tailândia é mais um exemplo, numa longa lista, de que não há seguro definitivo contra pressões de mercado.
A Tailândia cresceu 8% ao ano durante uma década, antes de ter problemas, viu suas exportações dispararem e foi um dos mais festejados "novos tigres" asiáticos. Mesmo assim, foi engolida pelo mercado ao tentar defender ao limite uma moeda vista como supervalorizada.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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