São Paulo, quinta-feira, 17 de julho de 1997
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Vamos parar de mentir aos brasileiros, senhores?

ALOYSIO BIONDI
As Bolsas despencam, as taxas de juros disparam nos mercados futuros, o governo usa o Banco do Brasil para despejar dólares no mercado, tentando evitar a alta da moeda-norte-americana. Tudo, por causa da crise na Ásia, - que era imprevisível, dizem a equipe FHC e os de-formadores de opinião. Verdade? Não. Mentira. Duas mentiras. Há praticamente três meses, esta coluna, sob o título "Pinóquios no mundo dos tigres, gatos e ratos" (24 de abril de 1997), dizia: "os" tigres viraram gatos e mais cedo (sic) do que se pensa voltarão a enfrentar a condição de "ratinhos" da economia mundial. Os famosos tigres asiáticos, tão festejados como exemplos para o Brasil, estão às voltas com gigantescos rombos em sua balança comercial, isto é, suas importações são imensamente maiores do que as exportações". E, prosseguia a mesma análise de abril: "A famosa Coréia do Sul, com seus famosos carros resplandescentes, enfrenta um saldo negativo de US$ 23 bilhões, em um ano; Hong Kong, US$ 19 bilhões; e as Filipinas, Tailândia e Cingapura, rombos de US$ 13 bi; US$ 12 bi e US$ 7 bi, respectivamente".
A crise que agora atinge os países asiáticos era portanto perfeitamente, matematicamente previsível - como esta coluna antecipou.
Mas, exatamente como ocorreu com o México, as Polianas e Pinóquios que tomaram conta do Brasil pós-Real continuaram a embalar a opinião pública com histórias da carochinha de "globalização", "modernidade", ""neoliberalismo" e semelhantes.
Agora, também como no caso do México, os analistas deslumbrados falam que houve um "ataque especulativo" contra as moedas dos países asiáticos, e que o Brasil está livre desse risco. Mentiras. Mais uma vez, mentira dupla.
Ataque?
Com essa lenda de "ataque especulativo", os analistas-pavão transmitem à opinião pública a idéia de que poderosos especuladores internacionais se reúnem e, numa espécie de conspiração, fazem manobras para desvalorizar a moeda de determinado país. Não é nada disso. O que acontece na verdade? Países como a Tailândia ou o Brasil, que "escancararam seu mercado", sofrem "rombos", tomam empréstimos, aumentam suas dívidas. Na primeira fase, de euforia, os banqueiros emprestam facilmente, e os investidores internacionais trazem dólares para realizar lucros fantásticos com os juros (nas nuvens) e Bolsas. Quando a dívida e os rombos atingem níveis exagerados, os banqueiros se retraem - e os investidores levam seu dinheiro de volta. Explode a crise.
Matemático
Não existe, portanto, nenhum "ataque especulativo". Os países com governos irresponsáveis, como o Brasil ou Tailândia, chegam a um ponto em que já despertam desconfiança. Os credores e investidores, obviamente saem em disparada, derrubando Bolsas e tumultuando o mercado financeiro.
Sem perda
Não adianta querer "condenar" a fuga dos investidores: sua reação, do ponto de vista econômico, é absolutamente compreensível. Por que? Quando um país começa a enfrentar "rombos" cada vez menos controláveis, ele é empurado a fazer "maxidesvalorizações" de sua moeda - pois o dólar mais caro aumentará o preço das importações, e estimulará as exportações (já que o exportador receberá mais reais, na troca dos dólares recebidos). Acontece que a "maxi" traz prejuízos aos investidores que têm seu dinheiro aplicado no país. Por isso, ele foge, quando pressente que o país enfrenta dificuldades crescentes e pode adotar esse recurso.
Sem ataque
Quando um investidor traz 100 dólares para aplicar no país, ele troca esse dólares por reais -e compra ações ou títulos diversos em reais. Isto é: se o Real vale um dólar, ele recebe 100 reais e aplica na Bolsa, por exemplo. Se o real for desvalorizado em 10%, por exemplo, os 100 reais, simplificadamente, "encolhem" para 90 dólares. Isto é, o valor do investimento também cai 10%, pois ele passa a ter ........ apenas 90 dólares. É lógico que o investidor não quer correr esse risco. Manda seu dinheiro para fora. E a crise explode.

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