São Paulo, domingo, 27 de julho de 1997
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Comissários são alvo de doenças graves

Há problemas cardiológicos, audiovisuais e mentais

DANIEL DE CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Glamourosa. Assim era vista, pelo menos até o início dos anos 90, a profissão de comissário de vôo. Mas não é bem isso o que revela o último relatório (1990-1995) do Diesat (Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e Ambientes de Trabalho).
Esses problemas são de ordem mundial, de acordo com o inglês Stuart Howard, secretário do Departamento de Aviação Civil da ITF (Federação Internacional dos Trabalhadores de Transporte).
"Um dos fatores que colaboram para isso é a grande tendência que as companhias aéreas têm de obrigar o comissário a ultrapassar o limite de horas de trabalho."
O Sindicato Nacional das Empresas de Aviação, procurado pela Folha para comentar os problemas, disse que só o presidente, Ramiro Tojal, que não está no país, está autorizado a dar entrevistas.
Hélio Carlos de Lima, 45, secretário de saúde do Sindicato Nacional dos Aeronautas, afirma que, no Brasil, a origem dos problemas está na lei 7.183 (5/4/84), que estabeleceu jornada de trabalho.
Ela deixou de ser livre e passou para 176 horas mensais -sendo 85 horas de vôo e 91 horas de reserva e de sobreaviso. "O resultado é que as empresas passaram a usar seus funcionários até o limite."
Lima está afastado há três meses por problemas psíquicos. Os motivos: duas crises graves. "Da última vez, pedi permissão para descer na parada seguinte. Fui suspenso. Tudo, devido ao estresse."
Segundo Marcius de Carvalho, 51, advogado, psicólogo e professor da área de psicologia jurídica da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), as principais sequelas dos problemas emocionais aparecem nas relações pessoais.
Ele afirma que vários de seus pacientes comissários são inseguros: "Para aqueles que já passaram por um acidente, a projeção de vida limita-se ao próximo vôo. Chega a ser um sentimento semelhante ao de um paciente terminal".
Outros problemas, segundo ele, são a falta de afetividade para com os filhos -"muitas crianças são problemáticas"- e o ciúme do parceiro. "É comum ver profissionais com mais de um casamento."
Como exemplo, ele cita o caso de uma paciente que, para voar, precisava deixar os filhos com a ex-mulher de seu então marido. "E, como ela tinha uma verdadeira obsessão pela aviação, seu marido acabou deixando-a para morar com a ex-mulher novamente."
Para M.K., 47, que trabalha há seis anos como comissária, "a profissão aparenta ser muito mais positiva do que realmente é". Por ter sofrido uma gastrite crônica recentemente, agora ela só trabalha na ponte aérea Rio-São Paulo.
Seu colega, que não quis se identificar, diz que vem brigando por mudanças nas regras para folgas: "Você viaja o percurso Brasil-EUA-Brasil-Europa em um período muito curto, sofre com o fuso e descansa apenas 12 horas".

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