São Paulo, domingo, 3 de agosto de 1997
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O alcance das reformas

ANTONIO OLIVEIRA SANTOS

A esta altura do ano fica claro que as reformas que venham a ser votadas pelo Congresso terão um alcance limitado. A iniciativa e a dinâmica do Poder Executivo foram definitivas para a revisão do capítulo da Ordem Econômica e a quebra dos monopólios estatais, o que é sem dúvida um feito a celebrar. Entretanto, à medida que o tempo foi passando, a motivação sustentada pelo presidente da República foi se diluindo na mente de deputados e senadores. O tema da reeleição relegou as demais reformas a um segundo plano, quando deveria ser um subtema da reforma política.
Em reunião convocada ao final de junho pela Fiesp, sob o título "Fórum das Reformas: A Nação Tem Pressa", o empresariado nacional encampou um ensaio da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), da Universidade de São Paulo, que buscava demonstrar que o atraso na votação das reformas administrativa, tributária e previdenciária reduzia à metade a taxa potencial de crescimento econômico do país, repercutindo obviamente sobre as demais variáveis macroeconômicas.
A reforma administrativa imaginada pela Fipe, implicando uma redução de 20% nos gastos com pessoal, contribuiria para um aumento de 0,4 ponto percentual na formação do PIB.
Analogamente, a reforma tributária teria, como consequência, uma redução na carga de impostos indiretos e um aumento de 1,5 ponto percentual na taxa de expansão do PIB, num resultado que combina a elevação da taxa de investimentos de 18% para 22%, com aumento de 5 pontos percentuais no consumo e redução de US$ 4 bilhões no déficit da balança comercial.
Por seu turno, a reforma previdenciária implicaria um acréscimo de 1,8% na taxa de crescimento do PIB e a possibilidade de criação de novos postos de trabalho no intervalo entre 1,2 milhão e 1,8 milhão.
O exercício teórico realizado pela Fipe parte do pressuposto de que, com as reformas, a carga tributária seria reduzida dos atuais 31% para 18% do PIB, e o seu objetivo foi visivelmente o de dramatizar o preço da inércia legislativa.
Mas a partir daí surge uma indagação: que reformas são essas? Reformas com a configuração ideal imaginada pelo mundo acadêmico, reformas que respondem às aspirações do empresariado ou reformas levadas a cabo dentro dos limites do politicamente possível?
Nas circunstâncias do atual momento político, em que foi dado o tiro de largada para o processo de reeleição, a resposta parece muito clara.
Ao que tudo indica, o Executivo não revela maior interesse pela reforma fiscal, até mesmo porque a carga tributária já ultrapassou a barreira dos 30%, e não há interesse imediato em reduzi-la.
Sobre a matéria, o presidente Fernando Henrique não poderia ter sido mais explícito ao celebrar em 1º de julho, com empresários de todo o país, o terceiro aniversário aniversário do Plano Real. Manifestou seus temores quanto a uma redução da carga tributária em ambiente de déficit fiscal e uma nova repartição de rendas que poderia vir, uma vez mais, em detrimento da União.
Todos os esforços do Executivo junto ao Congresso estão concentrados na prorrogação do FEF e, mais adiante, se voltarão para a permanência da famigerada CPMF.
No que concerne à reforma administrativa, a quebra da estabilidade funcional e o teto de vencimentos parecem ser seus pontos focais.
A dispensa por insuficiência de desempenho é algo bastante subjetivo e seguramente sujeito a um longo ritual a ser desenhado por legislação complementar; aliás, uma lei aprovada pelo Congresso, em 1990, já regulou essa matéria, sem maior proveito. Quanto ao teto salarial de R$ 12.700,00, ditado pelo Supremo Tribunal Federal, é evidente que poderá puxar o salário dos "marajás" para cima e não para baixo, como tem sido noticiado pela imprensa.
No tocante à reforma previdenciária, aí sim seria possível esperar importantes avanços, ajustando o sistema à nova demografia do Brasil e preparando a transição do regime de repartição para o regime de capitalização.
Vale a pena insistir em algumas qualificações sobre o que tem sido propalado quanto ao tema das reformas. Pelas razões expostas, a reforma administrativa, como está sendo votada, será um mero paliativo.
O maior sentido da reforma tributária seria reduzir o chamado "custo Brasil", mas, do ponto de vista governamental, caminha-se no sentido oposto.
A reforma previdenciária é, na verdade, a única proposição válida e objetiva, menos pelo que possa representar como ganhos em termos de PIB do que pela eliminação do déficit, sem o qual o sistema caminha inexoravelmente para o colapso.
Seja como for, as reformas são necessárias, e a sociedade brasileira, como um todo, não só os empresários, deve apoiá-las e pressionar pela sua aprovação.
Elas apontam na direção certa e representam o primeiro passo, do lado fiscal, para consolidar o enorme esforço que se vem fazendo para debelar a inflação e, juntamente com o programa de privatizações, corrigir a médio prazo os desequilíbrios estruturais do setor público. É esse o caminho do desenvolvimento sustentado.

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