São Paulo, quinta-feira, 14 de agosto de 1997
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Duas visões do Brasil

CELSO PINTO

Entre os vários indicadores desenvolvidos pelo FMI como alertas antecipados para possíveis crises externas de países emergentes, um deles tem funcionado muito bem: a relação entre o volume de moeda amplamente definida e o das reservas. Este indicador subiu tanto antes da quebra do México em 94 quanto da Tailândia neste ano.
Pois bem, argumenta John Welsh, economista-chefe para América Latina do Banco Paribas em Nova York, no Brasil essa relação tem-se mantido razoavelmente estável desde o início do Plano Real. Esta é uma das razões pelas quais Welsh acha improvável que o Brasil sofra um ataque especulativo contra sua moeda a curto prazo.
Quando as reservas caem, a economia deveria encolher. Se o governo é empurrado a aumentar a emissão enquanto as reservas caem, é porque está tentando salvar os passivos bancários. Funciona algum tempo, mas acaba em crise.
A definição de moeda usada por Welsh é o M2, a soma dos depósitos à vista, das reservas bancárias e dos títulos do governo. No México, essa relação entre M2 e reservas estava em 5, em 93, saltou para 7 em abril e chegou a 20 no pico da crise, em dezembro. Na Tailândia, a relação subiu de 3,6 no final do ano passado, para 4 em abril e 4,6 em maio, antes da crise final de julho.
No Brasil, a relação está em torno de 3 desde meados de 95. Mesmo considerando a definição mais ampla de moeda (M4), que inclui todos os ativos financeiros, a relação tem ficado ao redor de 5 há quase dois anos.
Além disso, diz Welsh, o índice de inadimplência do sistema bancário, embora alto, 18.8%, não cresceu no último ano e meio. Ele calculou, junto com o economista Edmar Bacha (do Banco BBA, associado ao Paribas), o valor das privatizações e concessões: serão US$ 13,9 bilhões este ano, US$ 22,1 bilhões em 98 e US$ 19,8 bilhões em 99. O suficiente para financiar o buraco externo nos três anos e ainda reduzir a dívida líquida interna de 32% do PIB para 30%.
A faixa de risco no Brasil só aumentará, a seu ver, a partir do terceiro trimestre de 98, quando o mercado vai realizar os lucros com a provável reeleição de FHC. O risco continuará em 99, quando sobrarão menos ativos para vender e, portanto, os resultados terão de aparecer.
A curto prazo, contudo, Welsh acha que um ataque especulativo contra o real só aconteceria se houvesse uma dramática queda na confiança no mercado e no governo. Por exemplo, um problema sério no mercado internacional, somado à indicação de que o governo resolveu soltar os gastos para ganhar a reeleição.
Ele acha pouco provável. As indicações de Gustavo Franco para o Banco Central e de André Lara Resende como secretário do presidente para cuidar das reformas futuras vão no sentido da austeridade.
Governadores austeros estão se dando melhor do que os irresponsáveis. Até mesmo as especulações sobre a sucessão presidencial em 2002 têm apontado dois conservadores fiscais como potenciais candidatos: Luís Eduardo Magalhães pelo PFL e Tasso Jereissati pelo PSDB.
O outro lado
Welsh pode ter razão, mas seu otimismo está longe de ser consensual. O diretor em Nova York de um grande banco de investimento americano, por exemplo, acha que existem 50% de chances de o Brasil sofrer um ataque especulativo contra sua moeda neste ano ou no próximo.
Se o mercado se convencer de que o Brasil terá que ter uma desvalorização, diz ele, ela acontecerá, independentemente do que indiquem alguns fundamentos. A crise monetária asiática tornou o Brasil mais vulnerável. Em termos absolutos, a demanda por dólares do Brasil é enorme. A da China também, mas o país tem superávit comercial e em conta corrente, além de US$ 116 bilhões em reservas.
Um sinal crucial, diz ele, é olhar o comportamento dos bancos brasileiros, muito mais sofisticados do que os mexicanos. No México, a saída de capitais em 94 começou com os mexicanos e levou uns seis meses. No Brasil, se houver, será iniciada pelos brasileiros, mas será muito mais rápida, questão de semanas.
Daí porque é crucial preservar as reservas. A perda de US$ 10 bilhões ou US$ 20 bilhões de reservas poderia, a seu ver, estimular um ataque especulativo.
Ele não acha que a crise é inevitável. Argumenta, contudo, que o Brasil precisa apresentar resultados nas exportações, no lado fiscal e nas reformas para manter a confiança.

E-maill: CelPinto@uol.com.br

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