São Paulo, sexta-feira, 22 de agosto de 1997
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Sherman expõe seu mundo sem homens

ERIKA PALOMINO
COLUNISTA DA FOLHA

Nova York vê em seu Museum of Modern Art, o MoMa, a exposição "Untitled Film Stills", da norte-americana Cindy Sherman. São 69 fotos em preto-e-branco que remetem ao imaginário feminino do pós-guerra, do cinema B produzido nos Estados Unidos entre as décadas de 40 e 60.
As mulheres de todas as fotos são interpretadas por Cindy Sherman que obteve reconhecimento com esse material produzido entre 77 e 80 e a partir daí se transformou num dos mais influentes nomes da produção contemporânea.
A exposição no MoMa de NY é patrocinada pela cantora Madonna. Junto com estas cópias foram compradas também outras sete obras da artista, em cores, do período de 1980 a 1989.
"O trabalho de Sherman é tão cheio de originalidade, charme e inteligência que, duas décadas depois, continua fresco e cheio de força", apresenta Peter Galassi, diretor de fotografia do museu.
Em "Untitled Film Stills", Sherman utiliza as técnicas da fotografia para obter um resultado que tange também o universo da representação pictórica.
É a própria artista quem concebe figurinos, cenários, maquiagem e a o intenso trabalho de perucas -fundamental para a criação que suas sempre dramáticas heroínas.
Assim, não se trata de auto-retratos, mas de retratar mulheres irreais inspiradas nos cartazes e fotos de publicidade desses filmes baratos da produção americana.
Com tudo isso em mãos, Sherman faz uma pós-moderna salada em que os ingredientes são cultura de massa, feminismo, clichês femininos, feminilidade, sensualidade, nostalgia e glamour.
As primeiras seis fotos foram feitas em série, com caráter experimental, de fanzine, como retratos da vida de uma jovem e loura atriz. Os B-movies remetem tanto ao que se convencionou chamar de marco zero do imaginário contemporâneo para a cultura pop e ao período da juventude da artista, hoje com 43 anos.
Sherman terminou a série quando acabaram, em sua opinião, os clichês deste vocabulário. São solitárias, urbanas e problemáticas garotas que, mesmo inexistentes, parecem estranhamente familiares. São manipuladas com perfeição as convenções do still cinematográfico (enquadramento, exagero, artificialidade, um certo voyeurismo, iminência do drama ou consequência dele).
Numa praia, ela chacoalha a toalha numa coquete calça branca saint-tropez; em frente ao hotel Plaza, procura alguém na multidão. De costas, uma silhueta violão se ajeita no espelho. No banheiro, ela arruma seu espartilho; no restaurante chora diante de uma taça vazia, e, no que seria um hospício, perde-se entre paredes cinzentas. O mundo sem homens de Cindy Sherman é o mundo de todos nós.

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