São Paulo, terça-feira, 26 de agosto de 1997
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ABORTO, A OMISSÃO DE FHC

A atitude do presidente Fernando Henrique Cardoso e de sua mulher, Ruth Cardoso, em relação ao projeto de lei que obriga a rede pública de saúde a realizar o aborto nos casos previstos por lei tem sido, de maneira exasperante, omissa. O silêncio do presidente e da primeira-dama pode acabar por se transformar em um empecilho a mais ao avanço dos direitos sociais no Brasil.
O presidente perdeu a boa chance de vir a público desautorizar o ministro da Saúde, Carlos Albuquerque -seu subordinado-, após este ter declarado que iria propor o veto a um projeto que estende à população pobre um direito garantido pelo Código Penal há 57 anos.
Ruth Cardoso, seguindo o marido, também perdeu a oportunidade de se manifestar, num momento delicado, favoravelmente ao aborto legal. Afinal, não se deve esquecer que sua trajetória como intelectual também está ligada à defesa dos direitos da mulher e da ampliação da cidadania.
Subordinar, como vêm fazendo o presidente e a primeira-dama, a tomada de posição pública sobre um tema tão vital às conveniências do calendário oficial, sejam elas a visita do papa ou as eleições de 98, é sucumbir à política miúda e a interesses mesquinhos, sempre injustificáveis.
Destoa, nesse quadro, o bom senso do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello, que manifestou-se, além do mais, a favor da extensão do direito de aborto aos casos em que o parto compromete gravemente a saúde da mulher ou de má-formação do feto -o que, aliás, vem sendo autorizado em centenas de decisões judiciais que interpretam a lei de modo mais liberal.
Não está em questão a legalização do aborto, mas a garantia de que os hospitais públicos cumpram com seu dever social. A legislação já põe o Brasil entre as nações com maiores restrições à interrupção da gravidez. Seria intolerável se pressões políticas e da Igreja Católica tirassem das mulheres pobres o direito ao aborto nos poucos casos em que a lei o autoriza.

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