São Paulo, domingo, 31 de agosto de 1997
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Musa antiaborto afirma que defensores são 'açougueiros'

BETINA BERNARDES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A estudante Maria Angélica de Oliveira, 16, chamou a atenção de todos os que presenciaram a votação do projeto que obriga os hospitais públicos a fazer aborto conforme previsto no Código Penal.
Após a votação, favorável à regulamentação, ela começou a chorar e a gritar para os defensores que eles eram "assassinos" e "açougueiros".
Morena de olhos verdes que mora com os pais e quatro irmãos, Angélica é considerada a musa dos movimentos contra aborto. Viaja pelo país inteiro fazendo palestras.
"Meu objetivo é a divulgação da doutrina espírita, a especialização contra o aborto e ser uma excelente médica", diz.
Leia abaixo trechos da entrevista que Angélica concedeu à Folha, na presença de seu pai, o empresário João Rodarte de Oliveira, presidente da Sociedade de Divulgação Espírita Auta de Souza.
*
Folha - Por que você ficou tão alterada após a votação?
Maria Angélica de Oliveira - Desde o instante em que eu apareci lá, já estava fazendo muita prece, fiquei muito nervosa pela desfaçatez das feministas, dos deputados, pela falta de respeito pelo ser humano e pela hipocrisia. Eu até faltei a uma prova naquele dia para ir lá e os deputados, na maior tranquilidade, decidindo matar crianças. Aquilo me deu uma revolta incrível e quando saiu a votação favorável a eles, eu desabafei, me descontrolei completamente.
Folha - Os defensores do projeto mostram que ele não cria nada de novo, apenas regulamenta o Código Penal, que existe há 57 anos.
Angélica - Eles estão mentindo. Isso inclusive é um estelionato. O projeto fala que basta a cópia do registro de ocorrência policial. Eu vou à delegacia, pego um registro da ocorrência, vou ao hospital e até sete dias depois é feito o aborto. Eles nem vão examinar, não vão ver se a ocorrência é verdadeira. A outra possibilidade é ter um atestado médico. Eu chego ao médico, falsifico um atestado e apresento. Com o eufemismo de estupro e risco de vida para a mãe, eles estão legalizando o aborto.
Folha - Por que você é contra o aborto?
Angélica - Porque o aborto é um assassinato frio e egoísta de crianças inocentes, afeta tanto a mãe quanto a criança.
Folha - Mesmo em caso de estupro?
Angélica - Mesmo em caso de estupro. O que a criança fez com a mãe? Ela não estuprou a mãe, não bateu, não fez nada.
Folha - Como a sua formação religiosa influenciou a convicção contra o aborto?
Angélica - Nós somos reencarnacionistas. E antes de ser religiosa, antes de ser espírita, é um assassinato de um ser humano. O espiritismo é totalmente contra o aborto, em todos os casos, porque nada que acontece é de graça. Se a mulher foi estuprada ou se ela está em risco, nada que acontece na terra é de graça. Tudo tem um planejamento espiritual e em nenhuma hipótese o aborto se justifica.
Folha - Os defensores dizem que a mulher tem o direito de não gerar um filho fruto da violência. O que deve ser feito se há estupro?
Angélica - Por que eles não fazem como nós, que amparamos as mães? No Lar Maria de Nazaré, já nasceram mais de 300 crianças. Muitas das mãezinhas foram estupradas e elas não odeiam os filhos. Por que em vez de ficar lá no Congresso 24 horas por dia tentando legalizar não só aborto, mas a esterilização, o casamento homossexual e outros interesses dos EUA, elas não fazem leis amparando a maternidade?
Folha - Se você fosse estuprada teria o filho?
Angélica - Com certeza eu teria o filho. Tenho conhecimento espírita do porquê. Ia criar meu filho com todo amor, todo carinho e fazer campanha contra o aborto. Se as pessoas procurassem mais a Deus e a Jesus, esses projetos de assassinar crianças não estariam acontecendo.
Folha - Você falou antes em homossexualismo e controle de natalidade. Por quê?
Angélica - Sou contra o homossexualismo porque isso é contra a lei da natureza, obviamente é contra a lei de Deus. Controle de natalidade também sou contra porque os EUA têm interesse de controlar a população do Brasil. Por que controlar a natalidade? O Brasil é um país muito rico, muito grande. Que motivos há para ficar controlando e determinando se a pessoa vai ter dois filhos ou não?
Folha - Você é contra o uso de métodos anticoncepcionais?
Angélica - Como espírita, sim. Sou contra todos os métodos, sejam eles naturais ou artificiais, porque nós sabemos que o planejamento é feito no plano espiritual. Se eu sei que está determinada uma quantidade exata de filhos, para que vou me prevenir? Somos reencarnacionistas, temos que deixar os espíritos virem reencarnar. A espiritualidade aproveita todas as oportunidades para mandar os espíritos. E as mulheres não deveriam impedir os espíritos de reencarnar.
Folha - Como você vê o sexo?
Angélica - Muitas igrejas e muitas religiões pregam que o sexo é pecado. O sexo não é pecado, mas também não é lixo. Deus nos permite procriar com o sexo, mas o sexo também é visto como prazer, mas não dessa maneira como eles divulgam, prazer, prazer, prazer. Todo sexo exige responsabilidade.
Folha - O que você pretende fazer daqui para frente em relação a esse projeto?
Angélica - Falo de aborto todo dia, ando o Brasil inteiro fazendo campanhas e palestras. A meta agora é falar contra partidos e políticos que são favoráveis ao aborto.

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