São Paulo, domingo, 31 de agosto de 1997
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Governo agiu de forma desencontrada

VALDO CRUZ; MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A atuação do governo federal na crise da Encol foi desencontrada. Ao mesmo tempo em que o Banco do Brasil liberou empréstimo para socorrer a construtora, outros dois bancos controlados pela União colaboraram para o fiasco da operação de salvamento.
No momento em que os bancos federais jogaram a toalha e passaram a defender a falência da Encol, entrou em cena o ministro Iris Rezende (Justiça).
Goiano, como a construtora, Iris ainda tenta uma saída negociada entre bancos credores, mutuários, governo e Encol.
O destino da empresa ainda é incerto. O próprio Iris não descarta a hipótese de uma falência tradicional, deixando mutuários no prejuízo -um desfecho previsto desde 3 de fevereiro, data do primeiro relatório do período de intervenção branca na empresa, ao qual a Folha teve acesso.
Era o caos. A situação da Encol foi descrita pelo interventor Jorge Washington de Queiroz como "extremamente crítica e precária, próxima à ruptura".
O Banco do Brasil, representado pelo diretor de Crédito Geral, Edson Ferreira, foi o primeiro a ser informado.
Comando
Na condição de maior credor da Encol, o BB comandaria as idas e vindas do programa de reestruturação da empresa.
Apesar da total falta de informações confiáveis e da contabilidade da empresa ter fugido ao controle, o BB apostou inicialmente na recuperação da construtora.
Em fevereiro, o banco emprestou R$ 2,7 milhões para o pagamento de salários atrasados. Hoje, o Ministério da Previdência quer saber como a Encol obteve a certidão negativa de débito que abriu as portas para o empréstimo -"uma porcaria", avaliou depois um assessor do presidente Fernando Henrique Cardoso sobre o valor do crédito.
Com o empréstimo, concedido a título de "ponte emergencial", ficava afastada temporariamente a possibilidade mais drástica de simplesmente fechar a empresa, deixando 710 obras inacabadas e 42 mil mutuários na mão.
Nessa altura, eram três os cenários possíveis para a Encol.
No primeiro, a empresa fecharia, deixando no prejuízo mutuários, governo e bancos credores, numa conta de R$ 3,5 bilhões.
No segundo, as obras seriam terminadas antes de o negócio fechar, ainda com prejuízo calculado em R$ 300 milhões.
O terceiro cenário, pelo qual o Banco do Brasil optou, previa o desenvolvimento da construtora, com possibilidade de novos lucros num prazo de 15 anos.
A operação de salvamento sofreu seu primeiro abalo ainda em fevereiro. Por orientação de Pedro Paulo de Souza, acionista majoritário afastado do comando da Encol, parte do empréstimo do BB foi parar na conta do seu irmão, Carlos César.
Quando tentou, o BB não conseguiu bloquear o desvio de R$ 250 mil do dinheiro que deveria servir para pagar funcionários.
Mais recursos
O passo seguinte da operação deveria ser uma nova injeção de recursos na Encol, de R$ 20 milhões, o que nunca chegou a acontecer, apesar de outra instituição federal credora, a Caixa Econômica Federal, também ter chegado a patrocinar a idéia.
Foram obstáculo ao negócio os votos contrários do Banespa -sob intervenção do Banco Central- e do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
O Banespa, segundo maior credor da Encol, se comprometeu a assinar o acordo que permitiria a retomada imediata de parte das obras. Durante dois meses, adiou a assinatura no acordo firmado entre os demais credores em 23 de maio. Acabou por negá-la em 23 de julho.
Nesse meio tempo, a situação da Encol tornou-se insustentável. Relatórios do interventor Jorge Washington de Queiroz apontavam o esgotamento da empresa.
No final de julho, o caixa da construtora apresentava um rombo de R$ 19 milhões, seis vezes maior que o empréstimo "ponte" concedido pelo Banco do Brasil cinco meses antes.
O desmoronamento da operação se consumou em 15 de agosto, na sede do Banco do Brasil. Reuniram-se nesse dia representantes do BB, CEF, Encol e a empresa WestMerchant, contratada para atrair investidores "estratégicos".

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