São Paulo, sexta-feira, 5 de setembro de 1997
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Bem-vinda, Pinacoteca!

MILÚ VILLELA

No mês passado, Danilo Santos de Miranda, diretor regional do Sesc (Serviço Social do Comércio), publicou, juntamente com a Fesp/SP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), uma vasta e importante pesquisa sobre os hábitos culturais na cidade de São Paulo. As respostas dos 1.233 entrevistados, com idade superior a 14 anos, apontaram a pouca avidez cultural do paulistano.
Esses resultados não foram surpreendentes. Revelaram um público muito mais consumidor cultural do que praticante de atividades diretamente ligadas à cultura. Para o coordenador da pesquisa, o sociólogo Luiz Octávio de Lima Camargo, os resultados são reflexos da monotonia, da impessoalidade e da artificialidade das atuais cidades.
Por outro lado, verificamos a explosão do número de visitas às grandes exposições internacionais recentemente realizadas nos museus da capital. Como explicar a grandiosidade numérica de visitantes formando filas imensas, estimulando uma competição saudável entre os museus, forçando-os a superar-se e gerando a expectativa do público sobre a próxima grande atração?
Desde a exposição Rodin, que teve uma visitação de mais de 376 mil pessoas, os museus brasileiros constataram que poderiam conquistar definitivamente seu público com exposições bem organizadas. A última Bienal internacional, com a criação de facilidades para os interessados (hora marcada, valores de ingressos mais baixos em horários ociosos e venda dos mesmos por telefone), obteve mais de 400 mil visitantes. O Masp, com a realização da exposição Monet, definitivamente comprovou esse fato: sucesso absoluto, com mais de 500 mil visitantes.
Não existiria essa afluência sem o interesse -seja ele qual for, artístico ou mera curiosidade- da população. O próprio Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), que quadruplicou seu público nos últimos dois anos, antes da reforma feita em 1995 era praticamente desconhecido da maior parte da população. Sem o aval da Prefeitura Municipal de São Paulo -que, acreditando em nossa proposta, forneceu uma verba de US$ 1 milhão-, seria impossível o convencimento do empresariado para a realização da campanha de fundos que possibilitou seu renascimento.
O povo brasileiro vem demonstrando cada vez mais o interesse em frequentar o mundo artístico, do qual não o separam apenas as questões econômicas, mas a dificuldade de acesso devida à insuficiência de informações. Essa lacuna, lentamente, está sendo preenchida pelos museus, por intermédio da aproximação com seu público.
As atividades em arte-educação, tradicionalmente voltadas para escolas e crianças, têm modificado seu perfil de atuação. Vários programas voltados para a terceira idade, universitários, famílias, professores e grupos diversos têm facilitado a iniciação das várias camadas sociais e de diferentes níveis de informação cultural a formas mais elaboradas de arte.
Apresentando-se de maneira atraente, didática e principalmente com a conotação de entretenimento, a associação da cultura com o lazer desobriga o visitante de possuir o domínio das linguagens artísticas, o que fatalmente acaba afastando o grande público. A visita a uma exposição deve se tornar um programa combinado: enquanto me divirto, estou aprendendo.
Na próxima segunda-feira, estaremos recebendo no Parque do Ibirapuera a ilustre vizinhança -ainda que temporária- da Pinacoteca do Estado. Durante o período de reformas do prédio da Luz, as exposições estarão acontecendo no Pavilhão Padre Manoel da Nóbrega (antigo gabinete do prefeito).
Será um momento único. Ao mesmo tempo, no mesmo local, estaremos concentrando grande parte das atividades do cenário cultural de São Paulo, representado por MAM, MAC, Bienal e Pinacoteca. Tudo isso com o pano de fundo do Parque do Ibirapuera, um dos locais preferidos do paulistano para o lazer semanal.
A Pinacoteca do Estado, dirigida desde 1992 por Emanoel Araújo, conseguiu, por meio de curadorias criativas e exposições extremamente bem montadas e bem documentadas, superar as enormes carências de infra-estrutura e recursos oficiais. Os resultados desse trabalho tão árido situaram novamente a Pinacoteca no circuito obrigatório das principais instituições culturais da cidade. A exposição Camille Claudel, que inaugura o espaço expositivo no Ibirapuera, completa o ciclo de mostras de três grandes escultores franceses, precedida pelas de Rodin e Maillol.
No MAM, a retrospectiva sobre Vicente do Rego Monteiro apresenta 170 obras desse importante pintor brasileiro, contemporâneo de Picasso e Braque em Paris. Foi o único modernista que experimentou reconhecimento internacional, e as obras, cuidadosamente selecionadas pela ampla pesquisa do professor Walter Zanini, contêm preciosidades vindas de museus franceses, como Grénoble e o centro Pompidou.
Não basta somente a preservação de nosso patrimônio histórico e artístico: é preciso torná-lo atraente e acessível. Esperamos que, com a vinda da Pinacoteca, o público frequentador do parque seja motivado a novas formas de lazer, principalmente voltadas para a prática e o consumo das artes visuais. Com a ampliação da oferta desses produtos, resgata-se o espírito que norteou a implantação do Parque do Ibirapuera, em 1954: a construção de um centro permanente para a demonstração do nível cultural paulista.

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