São Paulo, domingo, 7 de setembro de 1997
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A ASCENSÃO DO ANJO

DANIEL CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Maria Adelaide Amaral, autora do remake de "Anjo Mau", considera a protagonista da novela, a babá Nice (Glória Pires), uma versão anos 90 de Cinderela, a gata borralheira que encontrou seu príncipe.
Nice é uma moça suburbana, criada no Belenzinho (zona leste de São Paulo), que se emprega na mansão dos Medeiros, no Morumbi (zona sudoeste), como babá do filho de Stela (Maria Padilha).
Ainda namora o mecânico Júlio (Luciano Szafir), Nice se apaixona pelo irmão da patroa, o empresário Rodrigo (Kadu Moliterno).
Para a fria e calculista Nice, Rodrigo representa um "pacote" completo: além de ser o homem que ela idealiza, ele é rico, é a sua oportunidade de ascensão. E ela decide lutar por esse amor e começa a maquinar suas tramóias.
O bom-moço Rodrigo está noivo de Paula (Alessandra Negrini), e descobre que ela o está traindo com seu irmão, o bon vivant Ricardo Medeiros (Leonardo Brício).
Para se vingar da família e da traição, Rodrigo surge na alta sociedade paulistana acompanhado de uma simples doméstica, Nice.
A babá, aparentemente, é dócil e até sonsa. Mas, por volta do capítulo 30, o público irá conhecer seu lado anjo mau, quando ela começa a prejudicar o "anjo bom" da história, a personagem Lígia (Lavínia Vlasak), que tenta conquistar Rodrigo -seu amor desde a infância.
Sobrevivência
Em 1976, o original de Cassiano Gabus Mendes revolucionou a teledramaturgia com a primeira história de empregada que ascende na vida. Nice, para a época, era má. Primeiro, pela ousadia de conquistar um homem rico. Depois, pelas intrigas que armava. E, embora nunca tenha matado, morreu no final.
"A diferença entre a Nice de 1976 e a de 1997 são os anos 80, o colapso da ética", afirma Maria Adelaide Amaral. "Os anos 80 foram os anos da era Reagan e da ideologia yuppie. Isso inverteu os valores. Aquilo que era canalha nos 60 e 70, passou a ser esperto, inteligente, vivo. O lema virou se dar bem, não importava como."
E completa: "A Nice do Cassiano (Gabus Mendes) era extremamente tímida e passiva. Ela mais reagia do que agia. A nova Nice não, ela faz acontecer. Ela não fica esperando que a vida ou que o destino teçam suas tramas para se beneficiar das circunstâncias favoráveis. Ela fabrica as circunstâncias, sem a menor ética e sem o menor princípio. É o manual de sobrevivência dela."
A atriz Glória Pires, 34, também defende as atitudes de Nice.
"Existe uma preocupação em carregar nas tintas da maldade da Nice. Eu não concordo com isso. Acho que quanto mais sutil esse dado for introduzido na história, mais rico, mais interessante fica."
"Na novela, a chamam de anjo mau, mas ela é uma mulher que busca oportunidades. Maldade tem a ver com coisa ruim, vazia. Com a Nice não é assim, há uma história atrás dela. Ela busca uma coisa. Ela tem um objetivo, tem sentimentos", conclui Glória.
Racismo
Além do preconceito social, a nova versão de "Anjo Mau" aborda o racismo.
Tereza (Luiza Brunet) foi criada no "núcleo pobre" (o Belenzinho). Alpinista social, ela se casou com o empresário inescrupuloso Rui Novais (Mauro Mendonça), com quem teve dois filhos: Paula (Alessandra Negrini) e Bruno (Emílio Orciollo Neto).
Tereza nunca revela suas origens. Até que Bruno se apaixona por Vivian (Taís Araújo), ex-menina de rua, criada por Cida (Léa Garcia), que é a mãe de Tereza.
"Não quero discutir o racismo, mas mostrar. Não vou fazer discurso. Vou fazer novela, folhetim. Eu quero mais é a mulherada pegando o lenço e chorando", diz a autora.
São Paulo
A nova versão de "Anjo Mau" se passa em São Paulo -no original, era no Rio.
"Moro em São Paulo e seria difícil ambientar uma novela no Rio. Foi o Boni quem deu a idéia de que fosse em São Paulo, até porque a cidade representa o principal mercado", diz Maria Adelaide.
Segundo a autora, a novela mostra uma São Paulo cosmopolita, usando como cenários museus (MAM), avenidas (Luis Carlos Berrini e Paulista), parques (Ibirapuera), túneis (Ayrton Senna) etc. Até a exposição da escultora Camille Claudel, que começa amanhã no Ibirapuera, deverá servir de locação.
Uma mansão na avenida dr. Alberto Penteado, perto do clube Paineiras do Morumbi, serve como "residência" dos Medeiros. O dono exigiu em contrato que a Globo não divulgasse o endereço.
No 18º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo, consta que o imóvel pertence à empresa Judiso Participações S/A, que a comprou em janeiro de 1996 por R$ 927,9 mil.
A novela usa ainda edifícios nos Jardins e nas imediações do parque Ibirapuera. O personagem Ciro (Raul Gazolla) "mora" em um prédio onde o aluguel de um apartamento é de cerca de R$ 6.000.
No Rio, a emissora construiu uma vila do Belenzinho (zona leste), cenário do "núcleo pobre" da novela.

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