São Paulo, sexta-feira, 26 de setembro de 1997
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Sinais de briga

JANIO DE FREITAS

As regras eleitorais, dependendo do que saia agora do Congresso, podem ser decisivas para o resultado da eleição presidencial de 98, caso proporcionem alguma semelhança de condições entre os candidatos ou imponham, pelo travestismo da lei eleitoral no que já está chamado de Lei FHC, a mais fraudulenta e antidemocrática eleição direta no Brasil.
Daí a importância de tudo o que está ocorrendo na confrontação em torno das propostas votadas no Senado e na Câmara. Inclusive uma briga que parece ser apenas mais uma, e é muito mais expressiva do que isso.
A violência -nele, incomum- que o deputado Luís Eduardo Magalhães imprimiu, ainda anteontem, à sua briga ontem culminante com o deputado Carlos Apolinário, relator da lei eleitoral na Câmara, é um reflexo a mais das perturbações crescentes no governismo, dada a perda veloz das suas certezas de êxito eleitoral.
Ao dar à divergência caráter insultuosamente pessoal (e impróprio ainda em outros sentidos), por certo Luís Eduardo exibia também os efeitos das derrotas já sofridas e das outras já prenunciadas em pontos da lei eleitoral muito desejados por Fernando Henrique e pelas lideranças governistas. Derrotas mais incômodas para Luís Eduardo por não ter obtido, desde que é líder do governo, nenhuma vitória digna desse nome.
É possível que Carlos Apolinário tenha cobrado de Sérgio Motta um cargo na Telesp, como disse Luís Eduardo Magalhães, para montar a proposta de lei eleitoral como a queriam Fernando Henrique e seu grupo. É possível, porque há dois anos e meio a prática da compra-e-venda tem se esforçado para transformar a Câmara em caverna de Ali Babá ampliada. Mas, se é possível, não é provável que Apolinário se pusesse à venda, porque a lógica e todos os indícios lhe são favoráveis.
O governo que dá cargos de ministro da Justiça, da Agricultura, dos Transportes, para ficar só em alguns dentre os milhares que têm sido negociados na compra de apoios, não regatearia um cargo secundário na secundária Telesp. Ainda mais em se tratando de obter, por preço tão ridículo, o bem tão valioso quanto a lei eleitoral dos seus sonhos antidemocráticos. Assim como os itens do projeto Lúcio Alcântara que o Senado aprovou, com as facilitações indecentes à reeleição.
Só pelo direito de candidatura à reeleição, o governismo chegou até a compra explícita, em dinheiro vivo, dos votos necessários na Câmara. Negaria um carguinho pelo complemento decisivo? E mais incrível seria tal recusa se lembrarmos que seu suposto autor foi Sérgio Motta, logo ele que, entre suas façanhas, é citado como corruptor de deputados na confissão de um vendido.
Não é menos contrária à acusação o próprio motivo dado por Luís Eduardo para que a compra de Apolinário não acontecesse: "O governo não aceitou a chantagem porque não podemos transigir na ética nem na moral". É aí que o ressurgimento da pasta rosa, feito na resposta de Apolinário, ganha sentido.
A menos que o governo só possa transigir para bloquear certas investigações, como faria a CPI dos Bancos, cerceada, quando Luís Eduardo presidia a Câmara, para não investigar as doações do banqueiro Calmon de Sá a líderes políticos da Bahia, ou investigar a criação do Proer para salvar da falência fraudulenta parentes afins do presidente da República.
O destampatório do senador Antonio Carlos Magalhães, chamando Apolinário de ladrão, não vai além de modos pessoais. Mas Luís Eduardo, exemplo de esforço de contenção, oferece um reflexo valioso da instabilidade política em que o governo caiu.

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