São Paulo, domingo, 28 de setembro de 1997
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Feudalismo condena Coréia do Norte

HWANG JANG-YOP
ESPECIAL PARA A FOLHA

A Coréia do Norte chocou o mundo outra vez quando decidiu adotar seu próprio calendário "juche" (auto-suficiência em coreano, ideologia que defende o isolamento do regime comunista norte-coreano) ao final do período de três anos de luto por seu líder morto Kim Il-Sung.
A queda do stalinismo e da ex-União Soviética funcionou como sério aviso da história aos líderes norte-coreanos. Muitos países socialistas tiraram lições das reviravoltas históricas e acabaram adotando reformas e uma política de portas abertas. Mas os líderes da Coréia do Norte adotaram as piores características do stalinismo -o culto à personalidade e a ditadura de um homem só-, como princípio básico de governo. Em consequência disso, o próprio sistema governante da Coréia do Norte está mergulhado numa crise irrecuperável.
Hoje a Coréia do Norte sofre as dificuldades econômicas mais sérias do mundo e mendiga auxílio alimentar. A atual crise é o derradeiro aviso da história aos líderes norte-coreanos. No entanto, eles preferem não ouvir o aviso. Em lugar disso, procuram manter a dinastia de Kim Il-Sung, adotando o calendário "juche", característico do feudalismo, baseado no aniversário do líder morto, abandonando o calendário gregoriano usado em todo o mundo.
A Coréia do Norte é governada por uma ditadura de um homem só, misturada ao feudalismo e totalitarismo. É uma típica sociedade feudal disfarçada de socialismo num mundo moderno.
Está na hora da Coréia do Norte abandonar sua anacrônica ditadura e sua estratégia de reunificar a península coreana pela força, adotando reformas e uma política de portas abertas, com diálogo e intercâmbios intercoreanos.
É da natureza humana se opor à ditadura e buscar a liberdade. A ditadura individual que vai contra a natureza humana só pode se sustentar pelo recurso à violência e ao engano. Na Coréia do Norte, há uma rede onipresente de vigilância que monitora todos os movimentos dos norte-coreanos, desde o mais alto ao mais baixo.
Os governantes norte-coreanos estão doutrinando sua população, levando-a a pensar que seu objetivo de vida é ser fiel ao "Grande Líder" até o fim. Afirmando que o "Grande Líder" é a própria pátria, estão divulgando uma canção intitulada "Sem Você (o 'Grande Líder') Não Há Pátria". Estão propagando a idéia de que o "Grande Líder" e seu herdeiro são homens de grande sabedoria e inteligência, além de virtude e liderança excepcionais. Aceitemos a premissa de que o que dizem é verdade. Nesse caso, não podemos deixar de nos indagar como o "Grande Líder" e seu herdeiro levaram a Coréia do Norte e sua população a miséria tão grande e como não conseguem salvar centenas de norte-coreanos da fome.
A economia norte-coreana é dividida entre a economia do Partido Comunista, dos militares e do Conselho Administrativo Estatal. As fábricas e empresas que recebem em moeda forte estão nas mãos do partido. As fábricas de munições estão nas mãos do setor militar. A parte remanescente é classificada como a "economia geral do povo" e é administrada pelo Conselho Administrativo Estatal. A economia do partido e do setor militar praticamente pertencem ao "Grande Líder". Ele é o único que conhece as receitas e os gastos da economia do partido e do país em geral.
A crise com que a Coréia do Norte se confronta também se origina na sua política de tornar a Coréia do Sul comunista pela força. Com o exército como espinha dorsal da unificação, a liderança norte-coreana afirma que "o setor militar é o Estado, o povo e o partido". O Norte insiste que o Estado existe para os militares, não o contrário. É mais apropriado dizer que o Estado compõe seu orçamento com o que sobra dos gastos militares.
A liderança norte-coreana eleva deliberadamente o nível de tensão no país, declarando a iminência de uma invasão pela Coréia do Sul. Ao mesmo tempo, ela se gaba de sua capacidade militar, dizendo que o Norte poderá eliminar o Sul no caso de um confronto armado entre as Coréias.
A liderança norte-coreana afirma que a crise econômica é movida por uma série de desastres naturais e sanções econômicas impostas por países estrangeiros. É um absurdo. Não faz sentido que construam uma economia auto-suficiente e atribuam sua economia fracassada ao bloqueio econômico, ao mesmo tempo em que vendem armas no exterior. Se os líderes norte-coreanos reservassem para a população apenas uma pequena parte do enorme orçamento militar e das despesas gastas na deificação dos dois Kims, a escassez de alimentos seria significativamente aliviada.
Prosperidade
A população sul-coreana vive numa prosperidade que seus vizinhos norte-coreanos não podem imaginar. O Sul possui a capacidade e os meios de repelir qualquer invasão. Os sul-coreanos têm uma convicção comum: é preciso evitar uma guerra fratricida e ajudar os norte-coreanos.
Com seu crescente poderio econômico, o Sul tem condições de ajudar o Norte, mas lamenta o fato de não conseguir estender a mão a seus irmãos norte-coreanos. Quem impede isso são os próprios líderes norte-coreanos. Está na hora de refletir com calma sobre os graves pecados cometidos pelos líderes norte-coreanos. Eles são reféns da violenta teoria revolucionária e são assombrados pelo fantasma do militarismo.
Existe uma solução. O Norte não pode evitar a crise por meio de deificações como o "juche". Aqueles que reconhecem a necessidade de pôr fim aos crimes devem liderar o esforço para despertar o Norte. Os coreanos que vivem no exterior e se solidarizam com seus irmãos coreanos devem dar apoio total ao Norte, para que este abandone suas políticas mal concebidas e adote reformas e políticas de portas abertas, visando a unificação pacífica.

Tradução de Clara Allain

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