São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 1998
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Estado gasta mais hoje do que há 4 anos

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O Estado brasileiro aderiu ao neoliberalismo, privatizou empresas, demitiu funcionários e hoje está menor do que há quatro anos, certo? Não, errado, se os gastos públicos forem a referência.
Apesar de todas as medidas de contenção de despesas, o volume de recursos consumidos nos níveis federal, estadual e municipal passou de 27,24% do PIB, em 1994, para cerca de 35% em 1998.
Na opinião de economistas, o total de gastos é o critério mais razoável para definir o tamanho do Estado. Os percentuais citados correspondem à soma da carga tributária com o déficit público. Ou seja, o que Estado arrecada em tributos e o que ele gasta a mais do que tem à sua disposição. Para 98 foi usada a mesma carga tributária de 97: 27,81% do PIB.
Se a comparação for feita com 1993, o salto é ainda maior. A carga tributária naquele ano foi de 25,09% do PIB e houve superávit de 0,25%. Isso significa que o Estado consumiu 24,84% do PIB, cerca de dez pontos percentuais a menos do que deve ser gasto em 1998.
O crescimento de gastos ocorreu apesar do esforço do governo em reduzir o tamanho do Estado.
Privatizações
Entre 1994, ano anterior à posse de Fernando Henrique Cardoso, e 1998, último ano de seu primeiro mandato, o número de funcionários públicos da administração direta e das estatais, em âmbito federal, passou de 1,2 milhão para 886,8 mil. Havia 145 estatais em 1994. Extinções e privatizações reduziram o total para 92.
"O Estado produtor diminui, mas o Estado gastador aumentou", afirma o economista Paulo Rabello de Castro, sócio-diretor da RC Consultores.
Rabello de Castro usa dados do Orçamento da União para comprovar sua afirmação. Descontado o pagamento de juros, as despesas do governo federal passaram de cerca de R$ 130 bilhões em 1995 para aproximadamente R$ 180 bilhões em 1998. Um salto de 38,5%.
Se forem computados os juros, o cenário é desolador. Só neste ano, eles devem consumir R$ 70 bilhões, mais do que os R$ 53,8 bilhões destinados ao pagamento de benefícios da Previdência Social.
Na opinião de Wilson Cano, o pagamento de juros é o principal vilão do nó das contas públicas. "Entre o final de 93 até agora, a dívida pública duplicou", afirma Cano, que é professor de economia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Paulo Nogueira Batista Júnior e Raul Velloso acrescentam aos juros o crescimento dos gastos públicos com Previdência, assistência social e programas como o seguro-desemprego.
"A dívida pública também aumentou porque o governo federal socorreu Estados, municípios e o setor financeiro", observa Batista Jr., professor de economia da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
Segundo ele, a dívida pública é outro indicador que mostra o crescimento do Estado nos anos de gestão tucana. Em 1994, ela correspondia a 29,2% do PIB. Desde então, aumentou continuamente e deve atingir 43% do PIB em 1998.
Constituição
Os últimos anos viram uma mudança na natureza dos gastos estatais. "O governo deixou suas atividades lucrativas", critica Cano. A exploração do petróleo e a energia elétrica são algumas das poucas atividades que ainda têm participação do poder público.
Velloso, especialista em contas públicas, aponta a Constituição de 1988 como a origem do aumento dos gastos. "A Constituição mandou o Estado gastar mais em algumas áreas, principalmente com a Previdência", diz. "O dinheiro deixou de ir para investimentos em infra-estrutura."
Os gastos com o pagamento de benefícios da Previdência aumentaram 65% entre 1995 e 1998. Eram de R$ 32,6 bilhões e devem fechar este ano em R$ 53,8 bilhões.
As áreas de saúde, educação, reforma agrária, saneamento e habitação também passaram a receber mais recursos no período, com um crescimento de R$ 14 bilhões em 1995 para R$ 20 bilhões em 1998.
Batista Jr. utiliza os números para questionar os que "acusam" o governo FHC de neoliberal. "Esse é um governo desnacionalizante, mas não neoliberal." E justifica: "O Estado empresário diminuiu, mas a presença do Estado aumentou".

Texto Anterior: 'NYT' lembra morte de Chico Mendes
Próximo Texto: PIB cairá ao nível de 94, diz economista
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.