São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 1998 |
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Filhos de viciadas são 221 mil nos EUA
MARCELO DIEGO
A história é real e se parece com várias outras ouvidas nos últimos 30 anos por funcionários da rua 122, número 152 West, sede de uma das maiores casas de assistência a crianças cujas mães usam tóxico, álcool ou são portadoras do vírus HIV (causador da Aids) durante a gravidez. Segundo o Departamento de Saúde de Nova York, o uso de drogas na gestação é um problema que vem crescendo. Hoje, 2,3% das gestantes expõem seus filhos à cocaína durante a gravidez. Em 1988, o percentual era de 1%. Em seis anos, 15.371 crianças nascidas em Nova York registraram a presença de cocaína em testes feitos após o parto. O exame não era realizado anteriormente. Especialistas dizem que o uso de cocaína aumenta consideravelmente o risco de nascimento prematuro e diminui a imunidade dos recém-nascidos. "O efeito devastador do crack e da cocaína causa parto prematuro, separação da placenta, alta mortalidade, diminuição do peso e diversos outros problemas", diz Farrokh Shahrivar, do setor de neonatologia do Saint Luke's Roosevelt Hospital Center. Segundo ele, a exposição à cocaína altera a sensibilidade do sistema cerebral. O sistema nervoso do feto fica mais vulnerável a doenças. O professor explica que o crack provoca alterações na mãe por dois minutos. No feto, o efeito imediato é a insuficiência de pressão sanguínea. Restos da substância ficam acoplados à placenta, e o filho fica exposto à droga durante duas semanas. Se diagnosticadas a tempo, as doenças causadas pela exposição às drogas podem ser tratadas com sucesso. É isso que lugares como a Hale House tentam fazer nos EUA. Crescimento Mas o problema não está restrito à cocaína, e os números não são inexpressivos. Segundo a Napare (sigla em inglês para a Associação de Educação e Pesquisas Pré-Natais), só 5 dos 50 Estados dos EUA têm testes rigorosos sobre a influência de drogas em recém-nascidos. O Departamento de Saúde dos EUA diz que anualmente nascem 4,02 milhões de norte-americanos. Cerca de 5% (221 mil) deles são expostos a drogas durante o desenvolvimento fetal. O número não diz respeito às chamadas "drogas sociais", como álcool e cigarro. As drogas mais comuns são a maconha (2,9% dos nascimentos) e a cocaína, com seu derivado crack (1,1%). Os números da Napare são mais alarmantes e indicam que o número de "bebês crack" (crianças expostas às drogas) varia entre 350 mil e 700 mil por ano. Segundo Michael Lewis e Margareth Bendersky, professores da Escola Médica Robert Wood Johson, pesquisas sobre a influência de drogas em crianças só começaram a ser realizadas nos últimos 15 anos. O atraso pode ter custado algumas vidas. Com certeza, custou muito dinheiro ao governo. Um parto normal custa aos cofres públicos dos EUA, em média, US$ 2.000. Um parto de um bebê com problemas derivados da droga salta para US$ 11 mil. O custo extra envolve enfermeiras, monitoramento de pressão, testes constantes de urina e sangue, equipamentos de última geração e tempo de incubadora. Perfil As monitoras da Hale House são capazes de traçar um perfil das crianças que passam por lá. Quando bebês, choram até a exaustão, por causa das dores. Muitas crianças nascem com sintomas de viciados e sentem falta da exposição às drogas. Algumas delas reagem negativamente ao toque humano. Para evitar o desconforto maior, muitas crianças tomam banhos de várias horas. A água aquece a criança e lhe dá sensação de conforto e segurança. Algumas crianças são amarradas às camas, pois se debatem muito, em verdadeiras crises de privação. Mesmo quando os efeitos físicos são superados, as crianças crescem agressivas e com problemas emocionais, como depressão. Não é uma regra, mas uma constatação do perfil dos pacientes da casa. A preocupação com os bebês atingiu a Casa Branca. A primeira-dama Hillary Clinton coordena um programa que se chama "Mães contra as Drogas", visando esclarecer as parturientes. E a polícia pretende apertar o cerco aos traficantes. Em Nova York, cerca de 10 mil prisões por porte ilegal de drogas aconteceram no último ano (a maioria por cocaína e heroína, que voltou a ser comercializada ativamente). O prefeito Rudolph Giulliani diz que, na realidade, o número de traficantes presos é maior, pois muitos foram detidos por outros crimes que não o tráfico. É o princípio da política de "Tolerância Zero": não importa se o crime praticado foi roubar um carro ou furtar uma luva de um camelô. O importante é tirar o transgressor da rua. Para terminar: Glenda C. está se tratando para tentar se livrar do crack e visita regularmente seu filho, que completa 17 meses em janeiro, na Hale House. Texto Anterior: Republicanos querem julgamento rápido; Muçulmanos atacam bordéis na Indonésia; Navegantes refazem travessia pré-histórica Próximo Texto: Drogas afetam inteligência e crescimento dos bebês Índice |
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