Crítica - Teatro
'Let's Just Kiss' celebra o erro e a brincadeira do ator em cena
É uma peça sobre o teatro, em que os atores --entre os melhores dos elencos experimentais de São Paulo-- fazem de conta que estão ali se despedindo do palco.
E foi no segundo dia, quando, reza a lenda, tudo pode dar errado. E pelo menos uma coisa teria dado: uma falha nas caixas de som. Pelos relatos posteriores, foi erro de verdade, mas ao ver o espetáculo não estava claro. Propositalmente, nada estava claro.
No início da apresentação, é lido um e-mail que teria acabado de chegar, da diretora Elisa Ohtake, instruindo o público a fazer de conta que era o último momento daqueles atores em cena. Paradoxalmente, a diretora surge logo em seguida no palco.
Alguns minutos de intervalo, arrumou-se o som e o espetáculo continuou.
Não poderia haver nada mais teatral, tirado da realidade --se, é claro, aquilo de fato tiver sido realidade.
Nas performances de Elisa Ohtake, teatro, dança e artes plásticas se mesclam no que muitas vezes parece brincadeira. Para que funcionem, é preciso que espectador e ator aceitem o faz-de-conta.
Apesar de num teatro de palco italiano, "Let's Just Kiss and Say Goodbye" procura romper a chamada quarta parede, a separação invisível.
Mais que isso, porém, a premissa é que o ator se disponha a brincar com falas e cenas clássicas. Que rompa a resistência à troca incessante de personagens. Ninguém fez isso melhor, em meio aos entreveros do segundo dia, que Georgette Fadel.
É intérprete de amplos recursos. Enfrenta de um animal de peça infantil a papéis clássicos, e em cada um mergulha com a facilidade de uma troca de figurino.
Outros atores vão na mesma direção, mas com êxito mais pontual, caso de Luah Guimarães ao encontrar a representação muito engraçada de uma aranha. Rodrigo Bolsan se sai especialmente bem em diversas intervenções.
Registre-se que a performance não escapa da impressão de ecoar um exercício. Sensação reforçada pelos objetos de cena que remetem a jogos, assim como os figurinos "prêt-à-porter" ou de ensaio, além do palco vazio, expondo as coxias.