São Paulo, quinta-feira, 01 de maio de 2008

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Crítica/erudito/Pablo Rossi

Jovem abusa do equilíbrio ao inaugurar piano Steinway

ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA

Em 2002, com apenas 12 anos de idade, ele foi a estrela de uma histórica "masterclass" do pianista Stephen Kovacevich, na Sala São Paulo. Agora, com 19 e uma considerável lista de realizações nas costas, Pablo Rossi estuda no Conservatório Tchaikovsky, em Moscou. Veio a São Paulo inaugurar, anteontem, o novo Steinway do teatro Cultura Artística.
Continua com o mesmo jeito de menino travesso, entra e sai do palco gingando com uma passada característica; mas se esforça para sorrir pouco e manter a expressão de adulto. Não era essa a intenção, mas a frase anterior pode ser lida como metáfora do seu modo de fazer música, hoje.
"Uma das coisas mais fortes no jeito de você tocar é também o que enfraquece um pouco o resultado: sua habilidade para tocar tudo com equilíbrio. Equilíbrio demais." Era isso o que lhe dizia Kovacevich há seis anos. E o conselho não perdeu a pertinência: tanto na "Sonata nº 1" de Beethoven (1770-1827) quanto nas "Fantasiestücke" de Schumann (1810-56), e nos "Estudos op. 10" de Chopin (1810-49), Rossi mostrou habilidade, empenho, equilíbrio; mas será que não ficou devendo imaginação?
Tudo parecia controlado, num registro médio. Vale repetir Kovacevich: "É preciso estar sempre em guarda para não ser convencional na arte. Na vida, às vezes, isso é inevitável. Mas na arte não pode ser". Aqui e ali, era como se o jovem pianista catarinense desse mostras, mesmo, de outra música, presa dentro do que se ouviu. No "Estudo op. 10/1", por exemplo, paradoxalmente a única peça do programa inteiro em que ele tocou várias notas erradas, o que não tem maior importância.
Ou também em passagens do "Andante Spianato e Grande Polonaise Brilhante", de Chopin, onde rendas delicadíssimas de notas se deixam romper pelos afetos. É verdade que era seu primeiro recital desse porte aqui, num palco nobre, e na frente de seus generosos patronos, a família Baumgart, que também doou o novo piano. (Duas ações muito bonitas; nem tão bonito foi terem estampado os próprios nomes em letras douradas, na lateral do Steinway, em exibição permanente à platéia.)
A questão é que arrojo, na arte, não pode depender de circunstância. Pablo Rossi tem talento demais para continuar tocando como se isso fosse o mais importante.
O mais importante, na música, não é tocar; o mais importante é dizer. De um artista como ele, pelo menos, é isso o que se quer ouvir.


Avaliação: regular

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