São Paulo, sexta-feira, 02 de março de 2007

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Cinema/estréias - Crítica/cinema

"Faces" expõe angústia da vida burguesa

Divulgação
John Cassavetes, diretor de "Faces", e a atriz Gena Rowlands


SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

Não é difícil notar que John Cassavetes escreveu "Faces" (1968), seu quarto longa-metragem na direção, como uma peça teatral cujas longas cenas parecem intermináveis e só encerradas, tem-se a impressão, porque a montagem as interrompe.
Resta sempre aos personagens algo em suspenso, que ainda é preciso dizer, fazer ou tentar consertar -e a derradeira imagem do filme, de simbolismo extraordinário, representa como levar esse procedimento às últimas conseqüências, deixando o público na expectativa do que poderá ocorrer.
Na primeira versão, que foi exibida em festivais, Cassavetes usava a conclusão como um prólogo e contava, em flashback, o que havia levado o casal de protagonistas àquela situação de aparente bonança. A montagem definitiva, sem o prólogo, caminha linearmente até o final, agora em aberto.
Com essa opção, que o aproxima ainda mais de seu duplo na obra de Cassavetes, "Uma Mulher sob Influência" (1974), o filme acentua a força dramática produzida a partir do trabalho de improvisação com os atores. Não são eles que atuam para a câmera; é a câmera que os procura enquanto expõem sua vulnerabilidade.
Como o cineasta faria outras vezes, um casamento que passa por uma situação-limite funciona como microcosmo da sociedade. Richard (John Marley), executivo bem-sucedido, e Maria (Lynn Carlin), sua mulher, já não cabem mais na vida burguesa e infeliz que levam em Los Angeles.
Para o marido, a turbulência emocional é potencializada por uma garota de programa bem mais jovem (Gena Rowlands); para a esposa, por um nova-iorquino também mais jovem (Seymour Cassel). Outros personagens giram em torno deles, trazendo mais desconforto.
Já seria, apenas pelo argumento, uma experiência anti-hollywoodiana. Cassavetes reforça esse aspecto ao rodar o filme em 16 mm e em preto-e-branco, com a câmera quase sempre na mão e um emprego diversificado de película e luz.
Entre as filmagens (no primeiro semestre de 1965) e o lançamento, houve Maio de 68. "Faces" é uma antevisão da crise de valores que explodiria.

FACES     
Direção: John Cassavetes
Produção: EUA, 1968
Com: John Marley, Gena Rowlands
Quando: em cartaz no Cinesesc


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