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Crítica/teatro/"O Céu Cinco Minutos Antes da Tempestade"
CPT apresenta seus melhores frutos em drama sobre patologia
Sob direção de Eric Lenate, atriz Paula Arruda cristaliza seu potencial no palco, com Carlos Morelli e Patrícia Carvalho
LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA
Uma marca do teatro
contemporâneo é a
busca por reinscrever
a palavra na cena, reinventando-lhe um lugar. A dramaturgia
de Silvia Gomez para "O Céu
Cinco Minutos Antes da Tempestade" é exemplo notável
desta proposição.
Segundo fruto do Círculo de
Dramaturgia do CPT que chega
à cena, o texto sustenta um espetáculo que, sem abdicar de
uma situação dramática, mas
para além de esquemas convencionais, constrói-se na justaposição de falas aceleradas e
vozes intensificadas. Esta massa sonora organiza-se aos poucos no pensamento do espectador. A enunciação extremada
não favorece a formulação de
um sentido, mas permite leituras e possibilita narrativas.
Se há um tema em jogo é o da
patologia. Ele aparece explicitado sem recalques nem pudores, no núcleo familiar ou o
triângulo pai, mãe e cria. A ficção está oculta e o que se revela
é o estado limite da doença chamada família, quando a distância e a dependência mais intricada convivem em tensão. O
que se vê e percebe é a matéria-prima do patológico.
Mesmo não evitando as referências a nomes e circunstâncias, o grande feito da dramaturgia é manter-se pairando
acima deles como estridência
que não se apanha, ou impasse
sem porta de saída. O texto
convida o ouvinte a tomá-lo em
blocos sonoros fechados e articulados em repetições, de modo a insinuar alguma cognição,
mas sem abdicar de uma fruição mais aberta, da cena como
uma presença que fala por si.
Direção mínima
Para que se opere essa semântica desenraizada, é fundamental o trabalho do encenador Eric Lenate, que cria um
pano de fundo ideal ao trabalhar com um mínimo de signos
definidos -a cama, a caixa de
correio, as caixas de remédio
vazias, as cartas- e deixar aos
figurinos a apresentação dos
personagens. Estes são dúbios
e vagos: pai-intruso, mãe-enfermeira, filha-paciente.
Nesta oscilação entre pólos,
chamando-se até pelos nomes,
mas sem se reconhecer de fato,
eles orbitam regulares em um
espaço fechado de exposição, o
teatro. O único personagem ausente nessa dinâmica, e, ao
mesmo tempo, o mais presente, é o mestre-de-cerimônias,
um tipo de mordomo metafísico que abre e fecha a cena e que,
mascarado como um boneco de
pano, manipula os personagens
reais, estabelecendo um requintado distanciamento.
Tudo isso teria sido impossível, ou quimera, não fosse o
corpo e a alma de Paula Arruda.
A atriz alcança a maturidade,
em trajetória ímpar e realiza
um potencial que sempre foi
cristalino. Carlos Morelli e Patrícia Carvalho, o casal de estranhos velhos conhecidos, mantêm o tônus básico para que as
falas e berros da vítima, e bode,
maior possam ecoar. Também
é significante o lugar do espetáculo: a sagrada sala de ensaio de
Antunes Filho. É como se, expondo seu reduto, honrasse os
que melhor frutificaram seus
procedimentos.
O CÉU CINCO MINUTOS ANTES DA TEMPESTADE
Quando: sex., às 21h; até 28/11
Onde: Sesc Consolação (r. Dr. Vila Nova, 245, tel. 3234-3000)
Quanto: de R$ 2,50 a R$ 10
Classificação: não recomendado a
menores de 14 anos
Avaliação: ótimo
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