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Crise do CD muda a Galeria do Rock
Iniciada há cerca de seis anos, a debandada de lojas de discos abre espaço para estúdios de tatuagem e marcas de roupas
Edifício tenta se adaptar aos novos tempos abrigando oficinas e palestras culturais; síndico pretende construir um Museu do Rock
Fotos João Wainer/Folha Imagem
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Vista do primeiro andar da Galeria do Rock, centro que vê o crescimento de lojas de roupa e estúdios de tatuagem e de piercing |
THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL
Tão comentada, reportada,
teorizada e maldita, a crise da
indústria fonográfica está não
apenas mudando a forma como
a música é consumida e comercializada, mas alterou radicalmente a paisagem de um dos
mais movimentados e conhecidos endereços de São Paulo.
Cerca de 20 mil pessoas passam todos os dias por um dos
seis pavimentos, incluindo subsolo e cobertura, do Centro Comercial Grandes Galerias, no
nš 62 da r. 24 de Maio, centro
da cidade. Mas ninguém conhece ou trata esse portentoso edifício de linhas onduladas e piso
preto e branco, inaugurado em
1963, por Grandes Galerias.
Porque ali é a Galeria do Rock.
Ganhou esse apelido, em
1993, por concentrar, entre
seus 450 pontos comerciais, o
maior número de lojas de vinis
e de CDs da América Latina.
Nos bons tempos, contavam-se
mais de 130. Há uns seis, sete
anos, os bons tempos se foram,
e hoje restam apenas 45.
A debandada das lojas de discos poderia descaracterizar o
apelido. Não descaracterizou
pela política linha-dura de Antonio Souza Neto, o síndico do
prédio, que só libera espaço para o comércio de etnia roqueira,
como marcas de roupa jovem,
estúdios de tatuagem e de piercing, lojas de silk-screen, de
apetrechos para cigarro. Ou lan
house. A primeira foi inaugurada no fim de semana passado e
já causou revolta em um bocado de lojistas por anunciar que
faz "gravação de CDs".
Os números mostram os resultados. Existem hoje 145 lojas
que vendem roupas e/ou acessórios para jovens. O que mais
surpreende são os estúdios de
tatuagem/piercing. Em 2000,
havia seis; agora, são 22.
Se antes abrigava a "maior
concentração de lojas de vinis e
de CDs da América Latina", hoje esse superlativo vale também para esses estúdios.
Essa é a nova Galeria do
Rock, que além de Galeria do
Rock se transformou em instituto cultural, promovendo oficinas e exposições como a "Faces do Rock", ocorrida entre
dezembro e janeiro passados.
Um dos planos do síndico
Toninho é construir no quinto
andar um Museu do Rock, um
Madame Tussaud tupiniquim,
com estátuas de cera de roqueiros nacionais. Ele garante que o
projeto está caminhando e que
já houve conversas com a Petrobras para cobrir o orçamento, estimado em R$ 1 milhão.
Plástica
Uma metáfora errada compararia a Galeria do Rock a uma
mãezona. Errada porque no coração da galeria não cabe mais
um. Cabe apenas quem pagar
bem. Um aluguel ali -com o
condomínio incluso- chega a
custar quase dez vezes mais do
que nas ruas ao redor. No primeiro ou no segundo andar,
uma loja de 12 metros quadrados paga por mês de R$ 1.000 a
R$ 1.500, em média. No térreo,
mais movimentado, esse valor
chega a R$ 1.800.
Uma metáfora rasteira compararia a Galeria do Rock a uma
velha senhora calejada, que sofreu e viu de tudo, de alfaiates e
camiseiros que tomavam o edifício nos anos 70 e que depois
foram substituídos por punks e
roqueiros cabeludos, protagonistas de brigas feias pelos seus
corredores. Brigas em que chegavam a quebrar garrafa de cerveja para cortar o pescoço de
um infeliz, como testemunhou
Magrão, ou Dionísio Febraio,
proprietário da Aqualung, desde 1990 um reduto certo para
fãs de rock progressivo e de
heavy metal.
As brigas, os pontos-de-venda de drogas no subsolo e no
terceiro andar e gente fumando
maconha nas escadas são passado. Os pavimentos estão iluminados por 5.650 lâmpadas
que dão ao lugar uma cara de
Natal permanente e são interligados por escadas rolantes que
hoje realmente funcionam.
A transformação, segundo os
lojistas mais antigos, como
Luiz Calanca, da Baratos Afins
(29 anos de galeria), aconteceu
com a posse de Toninho como
síndico. Ele aceita a comparação com Rudolph Giuliani, o
ex-prefeito que implantou política de "tolerância zero" em
Nova York. Ele diz (o Toninho,
não o Giuliani) que a Galeria do
Rock, antes de ganhar o apelido, era uma terra de ninguém,
uma Amsterdã. E que as pessoas precisam ter a sensação de
segurança, por isso decidiu empregar 22 homens para tentar
transmitir essa sensação.
Mas ele não aceita a comparação com Fidel Castro, que está no poder em Cuba desde
1959. Desde que foi eleito, em
1993, Toninho diz que já passou
por sete reeleições. De dois em
dois anos há assembléia.
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