|
Próximo Texto | Índice
Crítica/Cinema
"Candy" perde o rumo nas contradições do "drug movie"
BRUNO YUTAKA SAITO
DA REPORTAGEM LOCAL
Praticamente um subgênero dentro do drama, o
"drug movie", ou filme
sobre drogas, a exemplo de
"Candy", em cartaz na cidade,
acaba levando os conflitos
emocionais a níveis extremos.
É como se produções assim
ficassem intoxicadas com a sua
matéria-prima temática, perdendo-se em espirais descendentes.
Poucos são os diretores que
injetam sutilezas no calvário de
junkies sem esperanças. Trabalhar com imagens de degradação humana não é suficiente
para traduzir na tela o desespero e as contradições do vício.
Em sua estréia no cinema,
Neil Armfield, australiano mais
ligado ao mundo do teatro,
adapta um best-seller local de
tintas autobiográficas e fica no
meio-termo. Ao mesmo tempo
em que repisa chavões do gênero, o diretor tenta se aproximar
do melodrama.
Candy (Abbie Cornish) é
uma garota de classe média, aspirante a artista plástica e em
constantes conflitos com os
pais. Dan (Heath Ledger) é o
seu novo namorado e narrador
da história. É esse rapaz, tolo,
egoísta e poeta de quinta categoria quem vai introduzir a moça no vício da heroína.
Armfield busca uma certa
transcendência em seu trabalho ao dividir a trama em três
segmentos distintos: "céu",
"terra" e "inferno", na seqüência, para reforçar a idéia de queda moral e física do casal.
Parece, no entanto, tímido ao
não explorar as possibilidades
que tendem para o surrealismo
de produções similares, como
"Drug store Cowboy" e "Train
spotting". O filme explora pouco, por exemplo, a sugestão de
que Dan e Candy são uma espécie de Adão e Eva num mundo
que lhes virou a cara.
"Candy" prefere fincar seus
pés num realismo frouxo.
Nesse caso, cenas de junkies
preparando suas seringas e injetando heroína acabam se revestindo de inevitável tom moral, acusatório.
Quando caem do êxtase dos
hormônios naturais da paixão
inicial e das drogas, Candy e
Dan chegam a uma terra de
pouco glamour.
O dinheiro não tarda a acabar. Como dois inaptos para o
trabalho que são, logo partem
para a marginalidade.
Dan começa a viver de furtos,
e Candy encontra na prostituição alguns trocados para sustentar o vício.
Mesmo que algumas cenas
pareçam estar lá só para chocar, principalmente no horripilante momento em que Candy
sofre um aborto, o longa escapa
da espetacularização barata do
deplorável "Réquiem para um
Sonho".
O filme de Armfield ganha
um rumo quando os atores,
principalmente a dupla central,
começam a tomar consciência
de que suas atuações superam a
trama. A partir desse momento, ganha força a opção de Armfield de transformar "Candy"
em um grande melodrama.
Dan e Candy buscam para si
um amor puro e radiante, como
a droga que corre em suas veias.
Pouco sabem que o êxtase é
passageiro e que o que era no
começo sonho logo se transformará numa lembrança melancólica. Nada é doce no mundo
de "Candy".
CANDY
Direção: Neil Armfield
Produção: Austrália, 2006
Com: Heath Ledger, Abbie Cornish
Quando: em cartaz no Unibanco Arteplex
Próximo Texto: Ator criou confusão com fotógrafo Índice
|