São Paulo, domingo, 05 de maio de 2002

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Pela primeira vez uma multinacional se une à prefeitura para promover o movimento

O Hip Hop toma posse da cidade

Eduardo Knapp/Folha Imagem
O trio Z'África Brasil (em pé, à esquerda), os DJs Nuts e Zé Gonzales (à direita), Tcheba e Rooney sob o viaduto Santa Efigênia



Red Bull Hip Hop Rua leva DJs, MCs, grafiteiros e dançarinos às ruas de São Paulo nos domingos de maio


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

É fato inédito: pela primeira vez, um festival dedicado à sempre marginalizada cultura hip hop acontecerá em São Paulo, à luz do dia, sob idealização e organização oficial de uma multinacional de amplo alcance.
O Red Bull Hip Hop Rua começa às 15h, na praça da rua Fidalga (Vila Madalena), em iniciativa conjunta da fábrica de bebida energética com a Coordenadoria da Juventude da Prefeitura de São Paulo. A produção executiva é do grupo Mundo Mix, até aqui identificado principalmente com a cultura eletrônica.
"O hip hop é uma manifestação cultural alternativa que traz muitos dos valores que identificamos com nossa marca, como o não-conformismo, a contestação, a criatividade, o vanguardismo, a auto-ironia, a descontração, a inovação e o profissionalismo", justifica o gerente de comunicação da Red Bull, Afonso Lau.
Ele diz que a empresa está consciente do papel social que o hip hop desempenha em camadas marginalizadas da sociedade e que não haverá choques entre, por exemplo, a contestação social habitual do movimento e o preço elitista de seus energéticos.
"A bebida é cara, mas não é só para quem tem dinheiro. A associação com o hip hop é boa para mostrar isso", explica.

Inclusão
Para a Prefeitura de São Paulo, o festival é parte de um projeto de inclusão, que pretende ultrapassar a abertura de circulação de informações entre grandes multinacionais e jovens de periferia.
Estrategicamente, o Red Bull Hip Hop Rua começa num bairro de classe média, numa espécie de "arrastão ao contrário" vinculado aos projetos de revitalização do centro da cidade, como admite o coordenador Alexandre Youssef, 27. Ponto pródigo para os grafiteiros desde os anos 80, a Vila Madalena assistirá à inauguração da festa, conduzida pelo artista plástico e grafiteiro Juneca e pelo mestre de cerimônia Kamau (leia programação completa ao lado).
"Queremos caracterizar a expansão do hip hop das periferias para casas noturnas em bairros de classe média como Pinheiros, Vila Madalena e Perdizes. É um fenômeno de certa forma oposto ao da cena eletrônica, que começou elitizada e hoje atinge todas as classes sociais", diz Youssef.
"Juneca é um artista que sofre preconceito dentro do próprio grafite, porque combate a pichação, diversifica sua atuação, dá entrevistas na mídia. Ao mesmo tempo, a praça da Fidalga é um lugar de forró, não de hip hop", diz.
Da Vila Madalena, o evento migrará para pontos-chave do centro da cidade (praça Roosevelt e largo São Francisco), com apoteose no dia 26, no largo São Bento.
Marco zero e ponto histórico do nascimento da cultura hip hop em São Paulo, a área foi palco das primeiras manifestações de músicos como Thaíde e dançarinos de rua como Nelson Triunfo. Manteve-se como foco central por mais de uma década, a partir de 83, e foi abandonado definitivamente após sua interdição aos artistas de hip hop, pelo Metrô, em 98.
Youssef fala dos objetivos gerais do festival: "A função é se relacionar com os movimentos emergentes protagonizados por jovens, fazendo com que se perceba que um movimento como o hip hop pode ser muito benéfico para a cidade, graças à arte e à agitação que ele pode proporcionar. E há, é claro, o impacto social de valorizar um movimento cultural que não está no mainstream".
Por trás disso tudo se promove a tentativa de rearticulação dos históricos quatro elementos constituintes da cultura hip hop, que os próprios participantes do festival admitem estarem fragmentados no Brasil atual.
Por quatro domingos, durante cinco horas, estarão reagrupados e atuando em sinergia DJs e mestres de cerimônias (apresentando-se sobre jipes militares adaptados), b-boys (os dançarinos de rua) e grafiteiros.


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