São Paulo, segunda-feira, 05 de maio de 2008

Próximo Texto | Índice

Som e vídeo viram arte microscópica

Paço das Artes abre espaço para videoartistas na coletiva "Inside" e para as obras sonoras do projeto "OIDARADIO'

Canadenses mostram o que está por trás das telas de TV e músicos criam atmosfera a partir de ondas sonoras, nas exposições abertas hoje

DA REPORTAGEM LOCAL

Se a arte reage à saturação de sons e imagens do mundo contemporâneo encolhendo a forma e turbinando a teoria, as duas exposições que o Paço das Artes abre hoje são indício claro desse curto-circuito: a não-forma, o barulho, o vazio e o refluxo de imagens mortas no lugar da estética convencional.
Enquanto "Inside", coletiva de seis videoartistas canadenses, busca revelar -sofrendo um tanto no caminho- o que está por trás da superfície plana e rasa das telas de televisão e de displays digitais, o projeto "OIDARADIO", canal de áudio virtual que transmite a partir de hoje obras sonoras feitas por músicos underground e artistas plásticos, tenta driblar a forma e criar atmosferas a partir de ondas de som.
Pouco se constrói, e as obras se legitimam a partir da lógica do microscópio: ampliando o que já está lá, trazendo à tona os bits e pixels que passam batidos no cotidiano. Não à toa, o que Gisèle Trudel e Stéphane Claude fazem juntos na dupla AE é explorar a superfície de um CD de áudio com lentes superpotentes, revelando a topografia dos dados armazenados ali.
"É trazer para o mundo visual algo que não se vê, a idéia do áudio como imagem", diz Trudel. Mas, sem querer, o esforço de revelar aquilo que jaz escondido volta a ser só forma. Quem se aproxima do monitor no espaço expositivo não entende estar diante da imagem do áudio. Vê só desenhos enigmáticos -forma pura.
O subversivo também cai por terra em "redTV", obra de Brad Todd que busca tornar visível o sinal de transmissão televisiva. É possível comparar o que um monitor de TV comum exibe às manchas de vermelho daquela imagem isoladas numa projeção ao lado, a marcar ali as "pegadas" do sinal, o que seria o resíduo da imagem.
Todd explica que o resultado final lembra um radar ou bactérias e microorganismos sob a lente do microscópio: a imagem digital como traço da atividade biológica. De novo, vale pela elegância das manchas de vermelho que dançam no "radar" a despeito do conceito.

Poesia em Morse
No canal de áudio que entra no ar hoje em www.oidaradio.org, Maurício Ianês transformou uma frase do poeta romeno Paul Celan em código Morse. Em tradução livre, quer dizer: a linguagem não constrói apenas pontes para o mundo, mas também para a solidão. Foi o que disse Celan numa carta a seu editor.
Em Morse, são batidas intermitentes que lembram respiros, sussurros e o barulho do mar. Incompreensíveis a quem ouve, os ruídos podem ser só alusão à solidão construída pela linguagem, objeto de escrutínio de Celan.
Ouvida por um fone, em casa ou no lounge construído para isso no Paço, é uma obra que funciona mesmo na solidão, fazendo vibrar algo desconhecido e tão irracional quanto a arte que se recusa a ser mera ferramenta da forma. (SILAS MARTÍ)


INSIDE E OIDARADIO
Quando:
abertura hoje, às 19h; de ter. a sex., das 11h30 às 19h; sáb. e dom., das 12h30 às 17h30; até 20/7
Onde: Paço das Artes (av. da Universidade, 1, tel. 3814-4832)
Quanto: entrada franca


Próximo Texto: Coletivo Avaf estará na Bienal de SP
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.