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Som e vídeo viram arte microscópica
Paço das Artes abre espaço para videoartistas na coletiva "Inside" e para as obras sonoras do projeto "OIDARADIO'
Canadenses mostram o que está por trás das telas de TV e músicos criam atmosfera a partir de ondas sonoras, nas exposições abertas hoje
DA REPORTAGEM LOCAL
Se a arte reage à saturação de
sons e imagens do mundo contemporâneo encolhendo a forma e turbinando a teoria, as
duas exposições que o Paço das
Artes abre hoje são indício claro desse curto-circuito: a não-forma, o barulho, o vazio e o refluxo de imagens mortas no lugar da estética convencional.
Enquanto "Inside", coletiva
de seis videoartistas canadenses, busca revelar -sofrendo
um tanto no caminho- o que
está por trás da superfície plana
e rasa das telas de televisão e de
displays digitais, o projeto "OIDARADIO", canal de áudio virtual que transmite a partir de
hoje obras sonoras feitas por
músicos underground e artistas plásticos, tenta driblar a forma e criar atmosferas a partir
de ondas de som.
Pouco se constrói, e as obras
se legitimam a partir da lógica
do microscópio: ampliando o
que já está lá, trazendo à tona os
bits e pixels que passam batidos
no cotidiano. Não à toa, o que
Gisèle Trudel e Stéphane Claude fazem juntos na dupla AE é
explorar a superfície de um CD
de áudio com lentes superpotentes, revelando a topografia
dos dados armazenados ali.
"É trazer para o mundo visual algo que não se vê, a idéia
do áudio como imagem", diz
Trudel. Mas, sem querer, o esforço de revelar aquilo que jaz
escondido volta a ser só forma.
Quem se aproxima do monitor
no espaço expositivo não entende estar diante da imagem
do áudio. Vê só desenhos enigmáticos -forma pura.
O subversivo também cai por
terra em "redTV", obra de Brad
Todd que busca tornar visível o
sinal de transmissão televisiva.
É possível comparar o que um
monitor de TV comum exibe às
manchas de vermelho daquela
imagem isoladas numa projeção ao lado, a marcar ali as "pegadas" do sinal, o que seria o resíduo da imagem.
Todd explica que o resultado
final lembra um radar ou bactérias e microorganismos sob a
lente do microscópio: a imagem digital como traço da atividade biológica. De novo, vale
pela elegância das manchas de
vermelho que dançam no "radar" a despeito do conceito.
Poesia em Morse
No canal de áudio que entra
no ar hoje em www.oidaradio.org, Maurício Ianês
transformou uma frase do poeta romeno Paul Celan em código Morse. Em tradução livre,
quer dizer: a linguagem não
constrói apenas pontes para o
mundo, mas também para a solidão. Foi o que disse Celan numa carta a seu editor.
Em Morse, são batidas intermitentes que lembram respiros, sussurros e o barulho do
mar. Incompreensíveis a quem
ouve, os ruídos podem ser só
alusão à solidão construída pela linguagem, objeto de escrutínio de Celan.
Ouvida por um fone, em casa
ou no lounge construído para
isso no Paço, é uma obra que
funciona mesmo na solidão, fazendo vibrar algo desconhecido e tão irracional quanto a arte que se recusa a ser mera ferramenta da forma.
(SILAS MARTÍ)
INSIDE E OIDARADIO
Quando: abertura hoje, às 19h; de
ter. a sex., das 11h30 às 19h; sáb. e
dom., das 12h30 às 17h30; até 20/7
Onde: Paço das Artes (av. da Universidade, 1, tel. 3814-4832)
Quanto: entrada franca
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