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São Paulo, sábado, 05 de julho de 2003

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ERUDITO/CRÍTICA

Goerner e Osesp tocam em Campos do Jordão

Chopin para reparar nossa desgraça

ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA

Depois da derrota do Santos, na quarta, ficou difícil torcer pelo pianista argentino na quinta. Mas o "Concerto nš 1" de Chopin (1810-49) é tão bonito e Nelson Goerner tocou tão bem que até a desgraça parecia reparada. Só os acordes arpejados naquela extraterrestre passagem do piano sozinho, no segundo movimento, colares de notas soltos em câmera lenta no espaço, já valeriam a noite; restauraram a confiança na vida e a amizade entre as nações.
O bis. É preciso falar do bis, porque sem ele o Chopin de Nelson Goerner não seria inteiramente compreensível. Agora que os músicos definitivamente desistiram de anunciar à platéia o que vão tocar, fica nos ombros do crítico o serviço: era o "Noturno" em dó menor (op. 48/1), do mesmo compositor. Mas tocado com irrupções da mão esquerda que quase não pareciam possíveis para o mesmo pianista.
Quer dizer: se Goerner tocou o "Concerto" mozartianamente é porque mozartianamente quis. (Chopinizou Mozart, também, por implicação, já que as influências são sempre ruas de mão dupla.)
O tempo que ele achou para o "Romanze" tinha a grande calma dos adágios de Mozart -a vasta calma das emoções tranquilas-, mas cheia de ópera por dentro, o que faz todo sentido para um compositor contemporâneo de Bellini, não de Haydn. E a Osesp, bem regida por John Neschling, fez um lindo cenário para as árias da heroína piano, e foi também coadjuvante das fantasias do herói teclado.
Uma senhora, de cabeça inteiramente grisalha, só balançava a cabeça, no final. "Sim." De novo: "sim, sim". Depois explodiu em palmas.
Antes do "Concerto", frustração. Verdade que Brahms (1833-97) jamais frustra ninguém; mas estava todo mundo à espera da estréia de "Em Torno da Pedra", do compositor paulistano Silvio Ferraz (1958). Ao que consta, as partes não ficaram prontas a tempo.
Depois do "Concerto" e do bis, não era preciso escutar mais nada; mas as maratonas musicais da Osesp não deixam por menos: "Suíte Quebra-Nozes" de Tchaikovsky (1840-93) e "Capricho Espanhol" de Rimsky-Korsakov (1844-1908). Dois clássicos populares, escolha convencional, mas nem por isso menos boa para a abertura do Festival de Campos do Jordão hoje à noite.
Numa palavra: "sim".


Osesp
     Onde: Auditório Cláudio Santoro (av. Arrobas Martins, 1.880, Campos do Jordão, São Paulo, tel. 0/xx/12/262-2334) Quando: hoje, às 21h Quanto: R$ 50



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