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ERUDITO/CRÍTICA
Goerner e Osesp tocam em Campos do Jordão
Chopin para reparar nossa desgraça
ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA
Depois da derrota do Santos, na quarta, ficou difícil
torcer pelo pianista argentino
na quinta. Mas o "Concerto nš
1" de Chopin (1810-49) é tão
bonito e Nelson Goerner tocou
tão bem que até a desgraça parecia reparada. Só os acordes
arpejados naquela extraterrestre passagem do piano sozinho,
no segundo movimento, colares de notas soltos em câmera
lenta no espaço, já valeriam a
noite; restauraram a confiança
na vida e a amizade entre as nações.
O bis. É preciso falar do bis,
porque sem ele o Chopin de
Nelson Goerner não seria inteiramente compreensível. Agora
que os músicos definitivamente desistiram de anunciar à platéia o que vão tocar, fica nos
ombros do crítico o serviço: era
o "Noturno" em dó menor (op.
48/1), do mesmo compositor.
Mas tocado com irrupções da
mão esquerda que quase não
pareciam possíveis para o mesmo pianista.
Quer dizer: se Goerner tocou
o "Concerto" mozartianamente é porque mozartianamente
quis. (Chopinizou Mozart,
também, por implicação, já
que as influências são sempre
ruas de mão dupla.)
O tempo que ele achou para o
"Romanze" tinha a grande calma dos adágios de Mozart -a
vasta calma das emoções tranquilas-, mas cheia de ópera
por dentro, o que faz todo sentido para um compositor contemporâneo de Bellini, não de
Haydn. E a Osesp, bem regida
por John Neschling, fez um lindo cenário para as árias da heroína piano, e foi também
coadjuvante das fantasias do
herói teclado.
Uma senhora, de cabeça inteiramente grisalha, só balançava a cabeça, no final. "Sim."
De novo: "sim, sim". Depois
explodiu em palmas.
Antes do "Concerto", frustração. Verdade que Brahms
(1833-97) jamais frustra ninguém; mas estava todo mundo
à espera da estréia de "Em Torno da Pedra", do compositor
paulistano Silvio Ferraz (1958).
Ao que consta, as partes não ficaram prontas a tempo.
Depois do "Concerto" e do
bis, não era preciso escutar
mais nada; mas as maratonas
musicais da Osesp não deixam
por menos: "Suíte Quebra-Nozes" de Tchaikovsky (1840-93)
e "Capricho Espanhol" de
Rimsky-Korsakov (1844-1908).
Dois clássicos populares, escolha convencional, mas nem por
isso menos boa para a abertura
do Festival de Campos do Jordão hoje à noite.
Numa palavra: "sim".
Osesp
Onde: Auditório Cláudio Santoro (av.
Arrobas Martins, 1.880, Campos do
Jordão, São Paulo, tel. 0/xx/12/262-2334)
Quando: hoje, às 21h
Quanto: R$ 50
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