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Crítica/artes plásticas
Exposição de Degas ilustra o tempo de crise vivido pelo Masp
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
A exposição "Degas, o
Universo de um Artista", em cartaz no Museu de Arte de São Paulo, o
Masp, é bastante simbólica da
crise que a instituição atravessa. Sem credibilidade no setor
artístico e com dificuldades em
obter patrocínio, que provocou
o vergonhoso corte de fornecimento de energia por três dias,
há duas semanas, o Masp sobrevive graças a seu capital inicial: a junção entre o poder econômico e político de Assis Chateaubriand e o poder cultural
de Pietro Maria Bardi.
Juntos, eles constituíram um
dos mais ricos acervos em arte
do mundo, de um período bastante abrangente, entre os séculos 13 e 20, com um significativo conjunto do modernismo
europeu, de fins do século 19.
É da apresentação desse conjunto que o Masp consegue sobreviver, alternando exposições do próprio acervo, com
pouca originalidade, e algumas
outras de ocasião, quando há
patrocínio e curadoria externos. Enquanto o Louvre, com
um acervo muito mais complexo, tem hoje um programa de
arte contemporânea que levou
o brasileiro Tunga, por exemplo, a ser visto por mais de 3 milhões de pessoas, o Masp se fecha para o circuito brasileiro.
Agora, com "Degas, o Universo de um Artista", novamente o
Masp recorre ao seu acervo como âncora de uma exposição.
"Maior evento cultural do ano"
é o anúncio solene da mostra
no site da instituição. Talvez o
fato de o Masp conseguir apresentar uma exposição com
obras que não só de seu acervo
seja mesmo um fato a ser considerado superlativo, mas, na situação em que se encontra, a
arrogância é descabida, especialmente num ano de Bienal
de São Paulo.
"Degas" é uma boa mostra
graças ao acervo do museu, mas
não se trata de uma retrospectiva significativa do artista.
Mestre em transformar o movimento em imagem congelada
-por isso as bailarinas como
tema-, o impressionista Edgar
Degas (1834-1917) criou uma
das mais belas séries sobre os
bastidores da dança, algo que
antecipou o trabalho feito por
fotógrafos sobre os bastidores
da moda nos anos 60.
Dessa série, seu ponto alto,
há poucas obras: "A Aula de Balé", do Museu de Arte da Filadélfia, e "Bailarinas nos Bastidores", da Galeria Nacional de
Washington, estão entre a meia
dúzia de contribuições de fato
significativas do exterior que,
entretanto, já valem a visita.
Mas uma retrospectiva decente
teria um conjunto mais representativo.
Por conta dessa ausência de
obras de peso só de Degas, é o
acervo do Masp que dá suporte
à mostra. Só em pinturas há 26
do Masp, contra 22 do exterior.
E, obviamente, o ponto alto da
exposição é o conjunto de esculturas em bronze, recém-restauradas, de que o museu é um
dos quatro, em todo o mundo,
detentor da coleção completa.
Exibidas em conjuntos dispersos, no entanto, as obras perdem a força de um grupo impressionante pela quantidade.
Ainda em pintura, há menos
Degas do que outros artistas
-são 19 contra 28-, fazendo
com que o acervo do Masp seja
usado para contextualizar o artista. A questão é que aí fica clara a necessidade de preencher
espaços, adensar a exposição.
Porque fez retratos, Degas
ganha uma das maiores salas da
mostra com outros retratistas,
em alguns casos com franca
desvantagem na comparação,
pois seus retratos expostos não
são os mais importantes. Por
que, então, submeter o artista a
tal vexame?
Há outros bons momentos
da mostra, como a seção dedicada às obras com cavalos como tema, aí sim, algo particular
na produção de Degas, e ainda
toda a série de trabalhos de Picasso tendo Degas como tema.
Mas não é o evento cultural do
ano, pois é preciso que o Masp
deixe de fazer exposições "faz-de-conta". Para tanto, será preciso que ele também deixe de
ser um museu "faz-de-conta".
DEGAS, O UNIVERSO DE UM ARTISTA
Quando: ter. a dom., das 11h às 18h
(bilheteria fecha às 17h)
Onde: Masp (av. Paulista, 1.578, tel.
3251-5644)
Quanto: R$ 7 a R$ 15
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