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São Paulo, sábado, 08 de fevereiro de 2003

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"SENHOR DAS FLORES"

Texto de Vinícius Márquez aprofunda tema do triângulo amoroso, com atuação de Caco Ciocler

Espetáculo revela o amor sem banalidades

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
Caco Ciocler e Elias Andreato, em cena de "Senhor das Flores"


SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

Não chegue atrasado, nem cinco minutos, em "Senhor das Flores": nesta montagem, cada momento é vital. É empolgante ver como Vinícius Márquez aprofunda no texto o eterno tema do triângulo amoroso, podendo contar com a inteligência de dois atores-diretores, dirigidos por um diretor-ator.
Falar de amor em arte é um sério desafio: é muito fácil cair em clichês mexicanos em nome de nobres banalidades como "a transformação do homem".
Evitando a tola pretensão de patrulhar o advento de uma "nova era", Márquez expõe o desamparo dos que se entregam à paixão, essa "dor feliz", na expressão de Fernando Bonassi.
Aqui, não há fórmulas preestabelecidas, e cada cena existe para questionar o que se afirmou na cena anterior.
No início, o marido abandonado se embriaga com o patético de sua situação para se valorizar diante do jovem e rico amante vindo para roubar seu grande amor.
Na hora de consumar sua vingança, no entanto, se reconhece na fragilidade do outro e cede a função de fazer a outra feliz.
Na segunda cena, anos depois, se inverte a relação de forças; e a terceira volta a misturar as cartas.
Com um humor agridoce, que confia na inteligência do espectador, pontuado de um lirismo lancinante, "Senhor das Flores" é um grande texto.
Exagera talvez na densidade do texto do marido, que exige muito do ator, podendo levá-lo ao artificial. Outro ator, é claro, que não seja Elias Andreato.
Transtornado e transtornante na primeira parte, chega à beira do excesso para recuar no último momento, com perfeita maestria de sua profissão.
Sua marcação barroca conta com o contraste das linhas retas de Caco Ciocler, que se contém em pausas duras, mas vai se entregando aos poucos, para tornar verossímil a surpreendente inversão que se segue. A partir de então, Ciocler confirma ser um dos melhores atores de sua geração, apoiando-se na imensa delicadeza de Andreato.
Nem encasulados em auto-indulgência pseudoterapêutica, nem ostentando apenas uma fria técnica, os atores se habilitam a falar de amor como uma vertigem compartilhada, expondo seu mistério, que conservam ao abrigo da banalidade.
A direção de Marco Ricca viabiliza essa busca essencial, contando muito com a inteligência do cenário e figurino de Aby Cohen e Lee Dawkins, mas perde a simplicidade ao utilizar de modo "cinematográfico" a bem composta trilha de Eduardo Queiroz e abusar, no final, da beleza da iluminação de Maneco Quinderé.
Nada que desautorize, no entanto, o espetáculo: "Senhor das Flores" tem a maturidade necessária para poder falar de amor.


Senhor das Flores
   
Direção: Marco Ricca Texto: Vinícius Márquez Com: Elias Andreato e Caco Ciocler Onde: Cultura Inglesa Pinheiros (r. Deputado Lacerda Franco, 333, Pinheiros, região oeste, tel. 3039-0553) Quando: Sex. e sáb.: 21h. Dom.: 20h. Até 27/4 Quanto: R$ 25 e R$ 30



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