São Paulo, domingo, 11 de novembro de 2007

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Espetáculos ironizam o mundo dos negócios

Peças em SP apontam ganância e alienação no dia-a-dia das empresas

Entre os espetáculos em cartaz, estão "O Método Grönholm" e "Como me Tornei Estúpido'; para executivo, há "caricatura"

GUSTAVO FIORATTI
DA REVISTA DA FOLHA

O cartaz da peça "Como me Tornei Estúpido", no espaço Viga, é um amendoim (com casca) vestindo terno e gravata. Um retrato que, de cara, traz à memória um quadro do pintor belga René Magritte, "The Son of Man", em que um homem, vestido da mesma forma, tem uma maçã tampando seu rosto.
Magritte, disse ele próprio, não queria simbolizar nada além de "um mistério". Já o cartaz, combinado ao título, é mais direto. E cairia muito bem para outras duas peças sobre executivos em temporada em São Paulo: "O Método Grönholm", no teatro Copa Airlines, e "Nunca Ninguém me Disse eu Te Amo", no Augusta.
São três produções que chegam a um coeficiente comum: a figura do homem de negócios como síntese de alguns dos grandes vilões contemporâneos: individualismo, ganância, alienação, estupidez.
A própria turma do mundo corporativo resolveu saber o que está se passando em cena. A mais pop, "O Método Grönholm", escrita pelo catalão Jordi Galceran, sobre um processo de seleção, foi vista por funcionários da Telefonica (80 pessoas), Embraer (250 pessoas) e Aché Laboratórios (111 pessoas), entre outras empresas.

Tendência internacional
Para o crítico de teatro da Folha, Sérgio Salvia Coelho, a dramaturgia com foco na vida de executivos é uma tendência internacional, espécie de continuação de um subgênero criado nos anos 70 que jogou luz sobre a classe média. "É um questionamento da vida cotidiana difundido nessa figura do sujeito de gravata e terno."
"Eu explicaria essa retomada do tema com a questão do progresso do país. A gente vê empresas ganhando milhões. Vejo esse movimento como uma reação a essa realidade", diz Beth Lopes, que dirigiu "Como Me Tornei Estúpido".
Adaptada de um livro homônimo do francês Martin Page, a peça tem como protagonista um intelectual que renuncia à própria inteligência em busca de felicidade e acaba entorpecido pelo poder financeiro.
O executivo Marcelo Fraiha, 25, vê a crítica ao mundo corporativo como uma espécie de parceria. "Acho que dinheiro traz conforto. Mas a peça traz alertas, nos faz pensar em como conduzir a vida profissional sem nos tornarmos alienados completos", opina.

Metas
Para Franz Keppler, autor de "Nunca Ninguém me Disse Eu Te Amo", que durante 12 anos trabalhou com comunicação corporativa, enriquecer não é bem o verbo a ser conjugado. "Não digo que todos os executivos sejam iguais. Mas existe uma coisa que norteia esse mundo: a palavra metas", diz.
São essas observações que costuram a trama criada por ele, sobre a empresária desiludida por ter sido demitida que solta o verbo. "Vamos fazer os idiotas praticarem rapel para sentirem que tudo é possível."
Muito do que escreveu, Keppler pescou na fonte. "Um dia, vi um cara dizendo: "Eu só participo dessas bobagens [atividades esportivas] para não ser demitido'", conta.
Irineu Sérvulo Silva, um executivo da Aché que assistiu a"O Método Grönholm", acha que as empresas que adotam políticas mais atualizadas se preocupam em contornar esses pontos negativos. Para ele, "O Método..." é caricato.


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