|
Índice
Espetáculos ironizam o mundo dos negócios
Peças em SP apontam ganância e alienação no dia-a-dia das empresas
Entre os espetáculos em cartaz, estão "O Método Grönholm" e "Como me Tornei Estúpido'; para executivo, há "caricatura"
GUSTAVO FIORATTI
DA REVISTA DA FOLHA
O cartaz da peça "Como me
Tornei Estúpido", no espaço
Viga, é um amendoim (com
casca) vestindo terno e gravata.
Um retrato que, de cara, traz à
memória um quadro do pintor
belga René Magritte, "The Son
of Man", em que um homem,
vestido da mesma forma, tem
uma maçã tampando seu rosto.
Magritte, disse ele próprio,
não queria simbolizar nada
além de "um mistério". Já o
cartaz, combinado ao título, é
mais direto. E cairia muito bem
para outras duas peças sobre
executivos em temporada em
São Paulo: "O Método Grönholm", no teatro Copa Airlines, e "Nunca Ninguém me
Disse eu Te Amo", no Augusta.
São três produções que chegam a um coeficiente comum: a
figura do homem de negócios
como síntese de alguns dos
grandes vilões contemporâneos: individualismo, ganância,
alienação, estupidez.
A própria turma do mundo
corporativo resolveu saber o
que está se passando em cena.
A mais pop, "O Método Grönholm", escrita pelo catalão
Jordi Galceran, sobre um processo de seleção, foi vista por
funcionários da Telefonica (80
pessoas), Embraer (250 pessoas) e Aché Laboratórios (111
pessoas), entre outras empresas.
Tendência internacional
Para o crítico de teatro da Folha, Sérgio Salvia Coelho, a dramaturgia com foco na vida de
executivos é uma tendência internacional, espécie de continuação de um subgênero criado nos anos 70 que jogou luz sobre a classe média. "É um questionamento da vida cotidiana
difundido nessa figura do sujeito de gravata e terno."
"Eu explicaria essa retomada
do tema com a questão do progresso do país. A gente vê empresas ganhando milhões. Vejo
esse movimento como uma
reação a essa realidade", diz
Beth Lopes, que dirigiu "Como
Me Tornei Estúpido".
Adaptada de um livro homônimo do francês Martin Page, a
peça tem como protagonista
um intelectual que renuncia à
própria inteligência em busca
de felicidade e acaba entorpecido pelo poder financeiro.
O executivo Marcelo Fraiha,
25, vê a crítica ao mundo corporativo como uma espécie de
parceria. "Acho que dinheiro
traz conforto. Mas a peça traz
alertas, nos faz pensar em como
conduzir a vida profissional
sem nos tornarmos alienados
completos", opina.
Metas
Para Franz Keppler, autor de
"Nunca Ninguém me Disse Eu
Te Amo", que durante 12 anos
trabalhou com comunicação
corporativa, enriquecer não é
bem o verbo a ser conjugado.
"Não digo que todos os executivos sejam iguais. Mas existe
uma coisa que norteia esse
mundo: a palavra metas", diz.
São essas observações que
costuram a trama criada por
ele, sobre a empresária desiludida por ter sido demitida que
solta o verbo. "Vamos fazer os
idiotas praticarem rapel para
sentirem que tudo é possível."
Muito do que escreveu, Keppler pescou na fonte. "Um dia,
vi um cara dizendo: "Eu só participo dessas bobagens [atividades esportivas] para não ser
demitido'", conta.
Irineu Sérvulo Silva, um executivo da Aché que assistiu a"O
Método Grönholm", acha que
as empresas que adotam políticas mais atualizadas se preocupam em contornar esses pontos negativos. Para ele, "O Método..." é caricato.
Índice
|