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"AS LÁGRIMAS AMARGAS DE PETRA VON KANT"
Peça de Fassbinder ganha leitura que privilegia o humor do texto
Montagem de Studart se impõe pela clareza
Divulgação
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Deborah Secco e Denise Weinberg em cena de "As Lágrimas Amargas de Petra von Kant" |
SÉRGIO SALVIA COELHO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
As lágrimas de Petra von
Kant já não comovem a platéia. Quando Celso Nunes encenou a peça de Fassbinder em
1982, numa montagem aclamada
que foi um dos ápices da carreira
de Fernanda Montenegro e consagrou Juliana Carneiro da Cunha, a platéia chorava junto a Petra, uma estilista famosa e sozinha, em sua busca pela redenção
através do amor da vulgar Karina.
Agora, na remontagem do teatro
Augusta, as pessoas riem.
O grande mérito da diretora Ticiana Studart é o de impor uma
outra leitura possível, além daquela que muitos consideram como definitiva. Baseando-se em
uma pesquisa aprofundada junto
a Alvaro de Sá, exposta em painéis
no saguão do teatro, Studart não
se deixa levar pela piedade e privilegia o humor e a auto-ironia presentes no texto.
Fassbinder em várias entrevistas declarou ser Petra, e não é difícil localizar também as referências reais dos outros personagens
da peça (além da amante Karina,
a submissa ajudante Marlene, a
amiga superficial Sidônia, a filha
Gabriela e a mãe, Valéria), todos,
menos a mãe, homens. O jogo de
inversão de sexo revela distanciamento que suaviza o "amargo"
das lágrimas que Fassbinder se vê
chorar apesar do auto-deboche
não tê-lo poupado do suicídio.
Studart, que tem no currículo
uma montagem baseada em Bukowski, constrói as personagens
por esse olhar amargamente irônico. Gestos estilizados e emblemáticos fixam cada um como peças de xadrez: as mãos de Petra, os
ombros de Marlene, as pernas de
Karina as caracterizam no primeiro olhar. Denise Weinberg está desenvolta no "expressionismo" das marcas e passa com leveza cinematográfica pelos desejos e
angústias de Petra, sem nunca se
deixar tragar por eles. Sua formação realista no entanto lhe permite momentos valiosos, nos breves
momentos em que sua máscara
parece se desfazer. Niwa Yanagizawa se livra inteligentemente da
comparação com Juliana Carneiro construindo sua Marlene como
um clown de cinema mudo, um
Stan Laurel de choro enternecedoramente cômico.
Quem vier para checar a beleza
de Deborah Secco não perderá a
viagem. Deborah constrói com
eficiência o glamour vulgar de Karina, tornando verossímil que alguém se apaixone à primeira vista
por ela. Se investir na carreira teatral, poderá superar sua limitação
vocal e ganhar autonomia criativa, se tornando uma boa atriz.
Não ocorre no entanto, como se
imaginava, a oposição entre a técnica teatral e a espontaneidade televisiva. Espontaneidade também
se aprende na escola, e dessa função de arejar o ambiente se incumbe Carla Guidacci com uma
segurança que a habilita para
vôos maiores. A larga experiência
de Suzana Faini é preciosa para
humanizar a figura da mãe, curiosamente a que mais espaço tem
para aprofundar sua pausas, e
Márcia Duvalle é ágil na superficialidade de Sidônia.
Eficiente e bem construída, a
montagem no entanto incomoda
às vezes pela radicalidade de leitura. Os personagens estão sempre
superexpostos, a eles são negados
qualquer intimidade e sutileza:
seu choro é sempre simulado, para que o outro ouça. Coerente
com o universo da peça, no qual é
possível ler no jornal a vida pessoal tanto de Petra como Karina,
essa "Lágrimas Amargas de Petra
von Kant" se impõe pela clareza, e
não pela sugestão.
As Lágrimas Amargas de Petra
von Kant
Direção: Ticiana Studart
Com: Deborah Secco, Denise Weinberg
Onde: teatro Augusta (r. Augusta, 943,
Consolação, tel.3151-4141)
Quando: qui. a sáb.: 21h; dom.: 19h
Quanto: de R$ 25 a R$ 35
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