São Paulo, segunda-feira, 12 de maio de 2008

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Crítica/"O Último Bandoneón"

Documentário pode interessar aos fãs de tango, mas entedia os cinéfilos

Divulgação
Cena de "O Último Bandoneón', documentário argentino sobre tango que está em cartaz em SP


CRITICO DA FOLHA

Jorge Luis Borges (1899-1986), que foi um escritor imenso, mais do que grande, achava que o tango corresponde ao lado sentimental, quase desprezível da alma argentina. Como quase tudo nas opiniões de Borges, isso era controverso. Cortázar, por exemplo, outro magnífico escritor, era fã.
Mas Borges interessa justamente por suas intervenções heterodoxas. Ele dizia, quando o acusavam de não ser argentino, que não devia ser mesmo, porque "os argentinos gostam de Paris, e eu prefiro Londres": só com isso punha uma pá de cal, mas com que classe, no nacionalismo.
Ele também podia ser malvado. Ao comentar um filme argentino, lembra que lhe disseram tratar-se "de um dos melhores filmes argentinos". E completava: "portanto, um dos piores do mundo". O tempo passou e nos acostumamos mesmo a entoar loas ao cinema argentino. Esquecemos que a produção de um país seja qual for é, em média, muito fraca.
É dessa fraqueza que sofre "O Último Bandoneón", documentário -em cartaz na cidade desde a última sexta-feira- extremamente convencional do diretor Alejandro Saderman. Aqui, não há como comparar com o melhor do documentário ou do documental brasileiro.
Podemos esquecer dos que -como Eduardo Coutinho e Andrea Tonacci sobretudo-, entre nós, trabalham tão intensamente esse limite entre o real documentado e a ficção, entre real vivido, representação, apropriação e verdade.

Limitações
Em "O Último Bandoneón", estamos diante da moça disposta a viver de seu bandoneón, mesmo que para tanto tenham de tocar em ônibus, do maestro que recria uma orquestra de tango, de aulas de dança, espetáculos do gênero. E entrevistas, pilhas de entrevistas.
Se do ponto de vista cinematográfico "O Último Bandoneón" tem muitos limites, a verdade é que pode muito bem chegar ao público que se interessa por tango em particular ou mesmo por dança de uma maneira geral.
Do falar portenho, das visitas a locais típicos, às pessoas típicas, às músicas tradicionais, tudo favorece esse contato. Não falta nem mesmo essa crença tão latino-americana de que, não fossem os nossos ritmos, os europeus morreriam sem ter como externar seus sentimentos. Esses aspectos singelos do universo musical estão contemplados também.
Num mundo tão regressivo em matéria de usos e costumes, reviver o começo do século 20 pode não ser, hoje, apenas um prazer de sexagenários. Os fãs do ritmo têm por que se esbaldar. Os cinéfilos não têm muito como não se entediar. (INÁCIO ARAUJO)


O ÚLTIMO BANDONEÓN
Produção:
Argentina, 2005
Direção: Alejandro Saderman
Com: Marina Gayotto, Natalia Arroyo, Rubén Jurado e outros
Onde: em cartaz no Reserva Cultural 4 (classificação: livre)
Avaliação: ruim


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