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Juliana Galdino interpreta serial killer
Após sete anos, atriz deixa CPT de Antunes Filho e estréia "Anátema", de Roberto Alvim, em que mata sete homens "por amor"
Personagem encontra eco no pesadelo contemporâneo, avalia atriz, para quem "o maior elogio a Antunes é continuar com minha vida"
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Sem efeitos de luz, de som ou
qualquer outro recurso que
mascarasse a (sua) verdade sobre si mesma e sobre os sete homens que matou, uma mulher
se pergunta: "Estou me confessando, como num tribunal? Ou
dando um testemunho, como
numa igreja?".
O evangelho da serial killer é
pronunciado por Juliana Galdino, 33, que vai à cena pela primeira vez sem a rubrica de Antunes Filho. O solo "Anátema"
(excomunhão, maldição), texto
e direção de Roberto Alvim, estréia hoje na Unidade Provisória do Sesc Avenida Paulista.
À Folha, Galdino falou sobre
a protagonista, autodefinida "o
exército de um homem só" a
peregrinar do bar para a casa
de suas vítimas, sempre a convite, "sem sadismo" e "por
amor". "O teatro é um elemento desarmonizador por excelência", diz a atriz. Veja abaixo
trechos da entrevista.
FOLHA - Quais as suas percepções
dessa mulher. Ela é uma anti-heroína? Como fundir as dimensões sagradas e assassinas?
JULIANA GALDINO - Após a morte
de sua mãe, o que dá a ela a percepção clara de sua própria finitude, a personagem mergulha num questionamento profundo acerca da maneira como
vive. Ao buscar respostas, mergulha numa dimensão épica,
faz de sua existência uma missão. Não procura a resposta em
teorias ou misticismos; procura
ouvir o que "seu sangue murmura". E descobre o assassinato como forma de amor.
Um amor que remete ao
amor cristão, no sentido da entrega, da doação, da compaixão.
Ao perceber que a maior parte
de nós já está morta -ou "enterrada", o que é bem menos
digno- percebe o assassinato
como única possibilidade de
ajudar, amar, aqueles cujas vidas já foram desperdiçadas e
que arrastam seus corpos pelas
ruas como "estátuas pré-moldadas, semeando ódio disfarçado em simpatia narcisista".
O serial killer é uma personificação da morte. Nesse sentido, é uma personagem numa
dimensão mítica, sagrada. Nosso interesse coletivo pelos assassinos em série deriva do fato
de que eles são uma espécie de
Deus, são o destino.
As respostas que a personagem dá aos desafios propostos
pela contemporaneidade são
discutíveis, mas a percepção
que ela tem do nosso estado de
coisas é absolutamente lúcida.
FOLHA - Em que medida a protagonista de "Anátema" encerra elementos de tragicidade e de peregrinações refletidas em Medéia e Antígona, mulheres atemporais que você interpretou recentemente?
GALDINO - Na desmedida. Para
que uma personagem mereça
estar num palco de teatro, deve
possuir uma biografia especial.
E, como diz Nietzsche, a tragédia é o lugar onde a vida humana é vivida em toda a sua potência. Os gregos colocavam em cena personagens cujas respostas
à vida espelhavam os seus piores medos. A desmedida dessas
personagens encontra raízes
no inconsciente coletivo, o que
as torna atemporais.
Acredito que essa mulher retratada em "Anátema" encontre eco no pesadelo contemporâneo, assim como Medéia e
Antígona ecoavam nas mentes
dos gregos do século 5 a.C.
Creio que ela se localize na esfera da discussão de questões
humanas eternas e, possivelmente, insolúveis.
FOLHA - Após sete anos de uma
carreira projetada e premiada com
Antunes Filho, o seu primeiro espetáculo-solo, pleno em ritos de passagem, representaria uma morte simbólica do "pai" freudiano?
GALDINO - Não. O Antunes foi e
sempre será um mestre para
mim. E o maior elogio que eu
posso fazer a ele é continuar
com minha vida, criando minha obra e andando sobre meus
próprios pés.
FOLHA - Por que deixou o Centro
de Pesquisa Teatral?
GALDINO - Provérbio zen-budista: "Não é possível que uma
árvore cresça à sombra de outra
árvore". Foram sete anos... O
CPT é um centro de formação
de atores. É um meio e não um
fim, como o próprio Antunes
gosta de dizer. A formação continua para o resto da vida. Foi
extremamente importante para mim esse tempo em que estive junto do Antunes e acho que
é muito importante que, agora,
eu retribua, num certo sentido,
tudo o que ele me deu tão generosamente. Saio do CPT tão feliz quanto entrei. Cumpri o ciclo e vou para outro, maravilha!
Triste dos que saem de lá tristes... Não entenderam nada!
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