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Luis Melo leva ao palco "dramaturgia a oito mãos"
"O Que Eu Gostaria de Dizer" foi escrito com diretor e outros dois intérpretes
Espetáculo, visto inacabado no Festival de Curitiba, usa excertos do português Gonçalo Tavares para retratar falência de relação
LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL
Um relacionamento chega ao
fim porque, segundo ela (Bianca Ramoneda) explica em carta,
"tudo desencaixou" e lhe parece demasiado estreito, ao passo
que ele (Marcio Vito) prefere
"não ver onde vai dar o mundo", mas antes "trazer o mundo
para onde quero estar".
Nas tréguas do embate afetivo, um homem (Luis Melo)
desfia máximas sobre solidão e
amor emprestadas do escritor
português Gonçalo Tavares e,
vez por outra, parece comentar
nas entrelinhas a crise do casal.
É em torno desses dois eixos
que se ergue a dramaturgia de
"O Que Eu Gostaria de Dizer",
que cumpre temporada paulistana depois de uma passagem
pelo Rio. A primeira escala, há
seis meses, foi na mostra oficial
do Festival de Curitiba, ainda
em versão inacabada e sob o título de "Deserto".
O texto é fruto da troca de vivências e inquietações entre os
atores, durante o mês e meio
em que viveram sob o mesmo
teto, num sítio de São Luís do
Purunã (PR).
O diretor Marcio Abreu
-que reprisa a parceria com
Melo iniciada em "Daqui a Duzentos Anos" (2005)- também
participou da escrita.
"De lá para cá, algumas propostas, como a do casal que está
para se separar, se solidificaram. A estrutura permaneceu,
mas mudou bastante o que
queríamos dizer com os personagens", explica Melo.
O ator acredita que a senha
para uma possível identificação
do público esteja na teia de desejos do trio. "São coisas que as
pessoas também gostariam de
dizer, mas ainda estão criando
coragem, esperando o momento. Ou talvez façam a opção de
não dizer, mas escrever [como
a personagem de Bianca]."
Melo celebra o fato de, na sala do Sesc, o espetáculo ser encenado "muito próximo ao público, respirar junto com ele"
-apesar de a dramaturgia não
ter caráter de depoimento direto à platéia:
"Sempre procuro uma relação íntima com o público, em
que eu não conte com nenhum
tipo de apoio, me exponha totalmente, mostre a minha precariedade. O teatro está se distanciando cada vez mais dessa
pulsão. Hoje em dia, dificilmente se conhece a voz natural
dos atores. Ela está microfonada, até mesmo em ambientes
pequenos".
Sem quarta parede
Mas ele vê focos de resistência a esse desfalecimento nos
palcos alternativos, em que "a
dificuldade de produção te
aproxima do público":
"Nesses espaços, se vê a cara
do ator, não há a distância da
luz a nos isolar. A quarta parede está sendo rompida com experimentação. A magia se dá de
outra forma, no "estar brincando", no resgate da parte lúdica
do teatro, que é fazer com que
as coisas aconteçam ali, do nada. Isso abre um pouco a imaginação do espectador e dos próprios atores, que não têm mais
o "estar escondido" atrás do
personagem", observa Melo.
O título "O Que Eu Gostaria
de Dizer", além de antecipar o
tom da carta escrita pela mulher que parte, seria também
uma referência à transparência
singular do fazer teatral?
"O teatro sempre foi um
meio de discussão daquilo que
está engasgado. O ator toma o
teatro como sua casa, o meio
em que mostra tudo, até seu
pensamento. Se o cinema causa reações fortes por meio de
efeitos especiais, o teatro tem a
provocação viva para fazer com
que as pessoas se mexam na cadeira", compara o ator.
O QUE EU GOSTARIA DE
DIZER
Quando: sex. a dom., às 20h30; até
26/10
Onde: Sesc Avenida Paulista - espaço
11º andar (av. Paulista, 119, tel. 3179-3700)
Quanto: R$ 5 a R$ 20
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 12 anos
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