São Paulo, sábado, 14 de fevereiro de 2009

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Peça de Dario Fo mostra publicitária em apuros preparando despedida

Inédita no país, comédia "Um Dia (Quase) Igual aos Outros" é coescrita por Franca Rame

LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL

A publicitária Júlia entrega de cara a razão do suicídio: perdeu o eixo, não se adapta ao "bando de oportunistas, hipócritas, aproveitadores... camelôs que vendem dignidade, bundas e peitos de silicone".
Sua tentativa (frustrada) de gravar um DVD de despedida para o ex-marido será o mote da peça "Um Dia (Quase) Igual aos Outros", do Nobel Dario Fo com sua mulher, Franca Rame. O texto de 1986, até aqui inédito no Brasil, ganha montagem (com as devidas atualizações tecnológicas) assinada por Neyde Veneziano e protagonizada por Débora Duboc.
Enquanto ensaia os termos e tons do testemunho derradeiro, Júlia atende a telefonemas de mulheres que a tomam por analista e derramam seu desalento. Na TV de plasma, o folhetim parece narrar a história da espectadora. Mais tarde, o detetive do filme, enfadado da ficção, põe-se a tagarelar com ela. Pelas frestas da fortaleza tecnológica em que a publicitária encastelou a solidão, chega o recado: ninguém está tão sozinho assim. "Os autores usam a figura da morte para falar do contrário dela, da pulsação da vida. Eles se apropriam dessa situação-limite, desse não suportar mais o mundo para fazer um ritual de passagem e libertação dessa mulher", diz Duboc, 43.
Mas que não se sugira que a sucessão de episódios inusitados é uma formulação do inconsciente de Júlia, uma defesa contra a morte. "Não é uma construção da mente dela. É absurdo, é hiperbólico, mas não entra no surrealismo. É um jogo de equívocos, algo concreto", afirma Veneziano, 58. Ao que Rame, 80, faz coro: "A vida é absurda. Guerras, violência, Bush, Berlusconi são todos improváveis se vistos pelas lentes da razão. Dario e eu só aumentamos o grotesco e a loucura, pois assim é nosso teatro". Para completar a jornada vertiginosa de Júlia, dois assaltantes que parecem saídos do circo Zanni (ou dos filmes "Esqueceram de Mim") invadem seu apartamento e se deixam embevecer pelo arsenal high-tech. "É um rasgo na dramaturgia para se homenagear o cômico de picadeiro", diz Duboc.


UM DIA (QUASE) IGUAL AOS OUTROS

Quando: qui., sex. e sáb., às 19h30; dom., às 18h; até 5/4 Onde: CCBB (r. Álvares Penteado, 112, Centro, tel. 3113-3651) Quanto: R$ 15
Classificação: não indicado a menores de 14 anos




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