São Paulo, quinta-feira, 14 de maio de 2009 |
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Britto estreia elogiada união de peças de Beckett
Ator traz à cidade sucesso de público e crítica no Rio, que inclui "A Última Gravação de Krapp" e "Ato sem
LUCAS NEVES DA REPORTAGEM LOCAL Na sala de reuniões de um hotel do centro paulistano, o ator Sergio Britto, 85, nem bem se acomoda na cadeira e já confidencia, em lamento jocoso: "Estou entupido de Beckett". É um reflexo do assédio da mídia desde que ele começou a encenar, no Rio, "A Última Gravação de Krapp/Ato sem Palavras 1", junção de duas peças curtas do dramaturgo irlandês (1906-89) num só programa. A temporada carioca, iniciada em agosto, recebeu críticas entusiasmadas e foi esticada após boa performance na bilheteria. Há dois meses, a vitória do ator no Prêmio Shell (o mais importante das artes cênicas do país) deu mais uma deixa para os pedidos de entrevista. Agora, é a estreia do espetáculo em São Paulo que o faz falar. No fundo, não há quem o farte de Beckett e seu discurso sobre "o desânimo, o fim, a impossibilidade, a inexistência de saída". O que não deve ser confundido, alerta, com "uma coisa lamentosa, decadente": "Beckett não é isso. Adorava a vida, bebia e trepava pra burro. Certa vez, [o diretor] Gerald Thomas foi encontrá-lo em Paris para falar de grandes temas intelectuais, mas ele só queria saber quem transava com quem na Broadway", diz o ator. Foi com Thomas, aliás, que Britto se arriscou pela segunda vez na dramaturgia do irlandês, em "Quatro Vezes Beckett" (1985), na pele de um cego que contracenava com o deficiente físico de Rubens Corrêa (1931-1996). Na primeira, em "Fim de Jogo" (1970), "só havia desespero, faltava humor, ninguém sabia nada de Beckett, nem nós [ele e o diretor Amir Haddad], que estávamos fazendo". Sem personagem Em 2008, voltou ao dramaturgo por obra de Isabel Cavalcanti, atriz e diretora que viu em montagem de "Fim de Jogo" -e que é autora de um livro sobre Beckett. "Ela me disse para não representar. Queria o Sergio Britto em cena." Um Britto que surge enclausurado num cubículo, a remoer tropeços do passado, em "A Última Gravação de Krapp". No aniversário de 69 anos, cumprindo um ritual anual, ele esquadrinha seu arquivo de fitas: a escolhida é uma de 30 anos antes, em que narra como se desfez de uma paixão por medo de perder o foco nos estudos. "É uma peça autobiográfica, uma homenagem do autor à mulher que ele chutou, só para se arrepender depois. Mas é tudo escrito de um jeito difícil, não didático, porque Beckett não acredita muito em nada, acha que não há solução possível, que o homem só está em pé por ser teimoso", afirma o ator. O tom seco, áspero, estende-se a "Ato sem Palavras 1", que encontra, em pleno deserto, um Britto "a quem tudo foi negado, que não quer mais nada, virou um bicho, desistiu". Sem sucesso, ele busca a sombra de uma árvore e faz malabarismos para alcançar uma garrafa de água. "É a síntese do que o Beckett pensa", observa ele. Britto já tem planos para quando for mesmo hora de "se desentupir" do irlandês. No segundo semestre, deverá dividir a cena com Isabel Cavalcanti, Suely Franco e outros em "Recordar É Viver", comédia dramática de Hélio Sussekind com direção de Eduardo Tolentino. A ÚLTIMA GRAVAÇÃO DE KRAPP/ATO SEM PALAVRAS 1 Quando: estreia amanhã; sex. e sáb., às 21h, e dom., às 19h30; até 14/6 Onde: Sesc Santana (av. Luiz Dumont Villares, 579, tel. 2971-8700) Quanto: de R$ 5 a R$ 20 Classificação: não indicada a menores de 16 anos Próximo Texto: Frase Índice |
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