São Paulo, quinta-feira, 14 de novembro de 2002

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TEATRO

Ator Sérgio Mamberti é o protagonista de "A Tempestade", de Shakespeare, que estréia amanhã no Sérgio Cardoso

Próspero conciliador ganha cores do XPTO

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
O ator Sérgio Mamberti vive o personagem Próspero em "A Tempestade", de Shakespeare, que ele apresenta com o grupo XPTO


VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Neste Brasil em que políticos descobriram na reconciliação uma estratégia, Shakespeare vem, mais uma vez, iluminar as consciências do que está em jogo quando o assunto é poder.
Uma das últimas peças escritas pelo dramaturgo inglês (1564-1616), "A Tempestade" ganha nova montagem em São Paulo. Pré-estréia hoje para convidados, no teatro Sérgio Cardoso, com Sérgio Mamberti à frente do elenco do grupo XPTO, dirigido por Osvaldo Gabrieli.
A peça expõe a queda e a ascensão de Próspero, duque de Milão que há 12 anos foi forçado ao exílio em uma ilha. Dono de poderes mágicos, ele se vinga ao provocar o naufrágio do barco de seus inimigos. A corte do rei de Nápoles, Alonso, é obrigada a desembarcar em território alheio.
Mamberti, 63, protagonista do espetáculo, define o personagem como um grande conciliador.
"Próspero recebe seus traidores numa situação quase edênica, numa terra sem leis ou regras, provoca-os, mas acaba evitando o confronto. Quer apenas que as pessoas respondam pelos seus atos, ainda que volte para Milão, renuncie ao poder e conviva com os mesmos", afirma Mamberti.
Essa convivência com a diferença, segundo o ator, reflete sabedoria e postura ética para se relacionar com o outro. "É um papel de maturidade. Apesar de tudo que sofreu, Próspero tem condições de perdoar. Shakespeare sempre fala das paixões, das ambições pelo poder, das frustrações pela perda, mas sob a perspectiva da afetividade. É assim com Rei Lear [que perde o trono para as filhas], é assim com Próspero. Eles não estão isentos das paixões do mundo", diz Mamberti, que completa 40 anos de carreira.
O ator revisita "A Tempestade", que interpretou pela primeira vez em 1969, dirigido por Alfredo Mesquita na Escola de Arte Dramática, em papel coadjuvante.
Em paralelo às manobras pelo poder, a história confronta civilização e barbárie (bárbaros geralmente são os outros, observa o filósofo Paulo Arantes). Logo que chega à ilha, acompanhado da filha Miranda (Gláucia Libertini), Próspero escraviza o nativo Caliban (Marcelo Perna). Este se apaixonará por Miranda, que por sua vez irá se enamorar de Ferdinand (Igor Cotrin), filho do rei Alonso (Carlos Farielo)
A porção mágica da peça é endossada por Ariel (Leonardo Abel), uma entidade do ar que ajuda Próspero a causar a tormenta. Ariel e Caliban também conspiram para conquistar a liberdade. O primeiro consegue. Quanto ao segundo, Shakespeare deixa seu destino em aberto.
O universo mágico é acrescido de elfos, ou gnomos, presentes em outros espetáculos do XPTO. O diretor argentino Osvaldo Gabrieli, 44, radicado no Brasil há 22 anos, diz que a peça de Shakespeare permite essa incursão pelo lado oculto da existência. Três elfos pontuam o espetáculo, quer a serviço de Próspero, quer azucrinando a corte ou Caliban.
Gabrieli afirma investir na comicidade sem perder o contexto dramático das cenas. Na sua concepção, os vilões não se configuram tão somente como tais; antes, são vilões patéticos. Para tanto, Marcelo Rubens Paiva e Rosana Seligmann foram escalados para traduzir e adaptar o texto e "torná-lo menos barroco".
A intenção é proporcionar uma linguagem mais acessível ao público jovem. O esforço contou com a participação de Mamberti na última etapa, fazendo as vezes de dramaturgista, aquele que colabora com diretor e elenco na criação ou edição do texto.
"Tomamos cuidado em limar redundâncias quando a própria imagem já traduz as palavras", diz o diretor. A concepção visual, marca do XPTO, não poderia ficar em segundo plano. Gabrieli concebeu sete espaços móveis, que são construídos ou desconstruídos conforme as cenas.
Uma das estruturas aéreas remete a plantas gigantes em um mangue. Outra, aos arcos renascentistas que sugerem ambiente de corte. Dirigidos por Roberto Firmino, dois instrumentistas executam a música ao vivo.


A TEMPESTADE. De: William Shakespeare. Tradutores: Marcelo Rubens Paiva e Rosana Seligmann. Com: Sérgio Mamberti e grupo XPTO. Onde: teatro Sérgio Cardoso (r. Rui Barbosa, 153, Bela Vista, tel. 288-0136). Quando: pré-estréia hoje, para convidados, e em cartaz a partir de amanhã; de qui. a sáb., às 21h; dom., às 18h. Até 22/12. Quanto: de R$ 20 a R$ 30. Patrocinadores: BrasilTelecom e Centrais Elétricas de Santa Catarina.


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