São Paulo, sábado, 16 de julho de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINEMA/"DIABO A QUATRO"

Filha de Joaquim Pedro renova chanchada carioca

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Desde o título -que, conscientemente ou não, evoca um clássico dos Irmãos Marx-, "Diabo a Quatro" se apresenta como uma comédia maluca, dessas que prezam mais o efeito cômico do absurdo do que a consistência dos personagens e da trama.
É nesse terreno, portanto, que o longa-metragem de estréia de Alice de Andrade (filha do grande Joaquim Pedro de Andrade) deve ser apreciado. "Não se pode pedir peras ao olmo", diz o provérbio espanhol. Ou, na versão brasileira de Julio Bressane: "Pitangueira não dá cereja".
Mas vamos ao filme. "Diabo a Quatro" coloca em movimento, no caos urbano de Copacabana, um punhado de personagens de várias origens geográficas e sociais.
Tudo gravita em torno de Rita (Maria Flor), jovem babá vinda da Amazônia que acaba se transformando na prostituta Mistery para seduzir o surfista Paulo Roberto (Marcelo Farias), fissurado em garotas de programa.
Além do surfista, acabam se envolvendo com a garota personagens como o cafetão moderno Tim Mais (Márcio Libar), dono da agência de garotas Heaven Promotions, e o menino de rua Waldick (Netinho Alves), que também veio do interior e sonha em ser artista de TV.
A diretora parte de alguns estereótipos -o surfista apalermado pela maconha, a provinciana inocente que se prostitui na metrópole, a perua (Marília Gabriela) que transa com "delivery boys" etc.- para logo deslocar seu sentido no meio da confusão mais ou menos programada que é a trama do filme.
Dito isso, a irregularidade de "Diabo a Quatro", suas quebras de ritmo, sua colagem de gêneros, sua dispersão narrativa, tudo isso está, até certo ponto, de acordo com certa tradição da comédia descabelada (lembremos de novo dos Irmãos Marx e das chanchadas brasileiras).
Talvez por se tratar de um longa de estréia, talvez por conta do grande número de roteiristas -nada menos que cinco-, há uma espécie de sofreguidão em colocar tudo na tela: todas as piadas, todos os personagens, todos os temas (prostituição, tráfico de drogas, desigualdade social, contraste campo/cidade).
O filme se constrói, assim, por acumulação, em contraste, por exemplo, com uma comédia como "Bendito Fruto", centrada na precisão do tom e na concisão da escrita. Com esta última, "Diabo a Quatro", à sua maneira, contribui para revigorar o humor brasileiro.


Diabo a Quatro
   
Direção: Alice de Andrade
Produção: Brasil, 2004
Com: Maria Flor, Marcelo Farias, Márcio Libar, Netinho Alves
Onde: em cartaz nos cines Frei Caneca Unibanco Arteplex 7 e Sala UOL de Cinema


Texto Anterior: Trabalhos empobrecem a idéia da tecnologia
Próximo Texto: "Diário de uma Louca": Comédia afro revela-se cúmplice do racismo
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.