THIAGO NEY
DA REDAÇÃO

Tida como escapista, a música eletrônica ganha caráter ativista com a décima edição da festa Temp, que acontece hoje.
O evento comemora os dois anos do núcleo paulista de "articulações ativistas e música eletrônica". "A festa é um catalisador temporário de ações temporárias que o núcleo promove", afirma Daniel Gonzalez, 24, um dos produtores da Temp.
As ações: street-art, cyberativismo, intervenção urbana e até apoio operacional para outros coletivos, tanto nacionais como estrangeiros.
"A idéia é enxergar a rua como um espaço livre para a arte, como um software, numa comparação com os softwares livres [que enveredam por outros caminhos aos tradicionais envolvendo direitos autorais]." Nesses dois anos, o núcleo também já promoveu oficinas de iniciação artística, de softwares livres para VJs.
A festa acontece em um galpão em Santo Amaro, na região sul da capital. Contará com DJs, VJs, rappers e artistas visuais. Entre as atrações que estarão presentes hoje, destacam-se o britânico Michael Forshaw, o grupo Apavoramento Sound System, o MC Gaspar, do grupo Z'África Brasil, e os DJs Julião e Jerome Hill.
"Realmente a música eletrônica existe para a busca da diversão, para nos esquecermos dos problemas, mas ela também representa uma cultura muito forte em que até o seu acontecimento já é uma afirmação disso. A Temp não é um espaço para a reflexão pura, é voltada para a diversão também. O que nós tentamos é criar enclaves, ilhas de informação dentro da cidade. Não temos nenhuma coisa contra o formato clássico de festas e raves", diz Gonzalez.
Para ilustrar o que propõe, Gonzalez faz uso do título de uma das mais famosas canções dos Beastie Boys, "Fight for Your Right (to Party)": "Lute pelo direito de se divertir; divirta-se com o direito de lutar".

Hibridismo
O cardápio musical da Temp é definido como "música eletrônica extrema". "Porque são gêneros híbridos que têm sua origem na música eletrônica de gueto, mas que na verdade utilizam estruturas experimentais e disformes e altíssimos BPMs [batidas por minuto], com influência do punk." Poderão ser ouvidos na festa gêneros como hardcore, breakcore, dubcore, wonky. "É uma oposição à eletrônica convencional, absorvida pelo mainstream", diz.
Os eventos da Temp têm caráter "catalisador". O núcleo espera receber cerca de mil pessoas -na última Temp, realizada na quadra da escola de samba Tom Maior, apareceram 1.200.
"Esta festa tenta representar os dois anos da Temp. Vamos criar uma zona de informação multimídia temporária (mistura eletrônica com projeções, street-art); é quase um ataque através de meios diferentes. Teremos também VJs de outros Estados em projeções com sinais diferentes de vídeo; é como uma luta entre os VJs, além de intervenções de MCs, como o MC Gaspar", afirma Gonzalez.

Fronteira
Pela primeira vez no Brasil, Michael Forshaw é representante do que se convencionou chamar wonky tecno e, em seu set, ele mistura tecno, electro, house de Chicago. Será live PA, em que o DJ utiliza sintetizadores e até chega a cantar. "Michael Forshaw passa das fronteiras demarcadas da eletrônica. Ele desconstrói os outros gêneros", explica o produtor da Temp.
Antes do início da festa, programado para as 23h, haverá uma "celebração da contracultura que veio das ruas". "Convidamos o Dubversão, um sistema de som que resgata as radiolas que existiam na Jamaica. É como uma mídia itinerante, com ragga, dancehall." A apresentação começará às 22h, nos arredores do galpão.
O núcleo paulista participará, no dia 4 de dezembro, do festival Showskills (www.showskills.com), em Manchester (na Inglaterra), evento voltado para ativismo e arte na internet. "Lá haverá discussões sobre as novas práticas de intervenções, com debates e oficinas."