São Paulo, quinta-feira, 17 de setembro de 2009

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Crítica/"O Pelicano"

Montagem evidencia limitações do texto

LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

Se até os grandes dramaturgos têm obras menores, sempre é possível descobrir nelas brilhos ocultos.
Não é o caso da montagem de Denise Weinberg de "O Pelicano", a última das quatro "peças de câmara" que August Strindberg escreveu em 1907 para integrarem o repertório de seu Teatro Íntimo, em Estocolmo.
O espetáculo não revela as pérolas insuspeitas do texto e, pior, evidencia suas limitações.
As referidas peças se inspiram na música de câmara, tendo em comum uma abordagem meticulosa das relações íntimas em que o tema, ou motivo, se impõe sobre a estrutura da obra. A mais famosa delas, "Sonata dos Espíritos", reflete particularmente essa fase em que o gênio sueco está preocupado com a questão da vida após a morte. Suas leituras do período incluem o "Fédon" de Platão, diálogo sobre a imortalidade da alma, e a filosofia mística de Swedenborg, que prevê uma existência concreta para as almas dos mortos.
"O Pelicano" marca certo recuo de Strindberg ao naturalismo e à forma dramática mais tradicional que ele explorava desde suas primeiras peças, quase vinte anos antes. Em vez do tom já explicitamente expressionista da "Sonata dos Espíritos", em que alguns personagens são verdadeiros fantasmas convivendo entre seres vivos, aqui os personagens estão todos vivos. Mesmo assim, o pai da família, recém-falecido, reaparece metaforicamente nos movimentos estranhos, indicados pelas rubricas de objetos como uma cadeira de balanço na sala onde transcorre a ação.
A encenação de Weinberg se esforça para resolver as demandas do texto e chega a encontrar soluções interessantes para dar conta de seus aspectos mais obscuros. Assim, ventiladores instalados nas coxias provocam um sopro gelado que, às vezes, percorre o palco e sugere forças do além. Mas porque a peça está ainda próxima do puro drama e fundada essencialmente nos diálogos, depende para se efetivar muito mais dos intérpretes do que de qualquer efeito cênico.
No conjunto, o desempenho dos atores e atrizes não alcança o grau de verossimilhança que o drama naturalista necessita para cumprir seus propósitos.
As identidades são delineadas, mas, presas da hesitação do autor entre caracterizá-las pelos traços mundanos ou contaminá-las de espiritualidade, não se mostram convincentes.
Uma opção seria reconhecer na peça essas pulsões simbolistas que forçam a forma dramática e prenunciam sua explosão. Isso implicaria não explorá-las apenas como ilustração e transcender a fábula, numa cena emancipada de suas amarras que, de algum modo, reinventasse Strindberg.
O mérito de montar um dos textos menos conhecidos desse grande dramaturgo foi superado pela dificuldade de fazê-lo de um modo relevante.


O PELICANO

Quando: quarta e quinta, às 21h; até 24/9
Onde: teatro Sérgio Cardoso (r. Rui Barbosa, 153; tel. 3288-0136)
Quanto: de R$ 10 a R$ 20
Classificação: 14 anos
Avaliação: ruim




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