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CINEMA
"Uma Receita para a Máfia", que tem o ator Danny Aiello no elenco, se passa em restaurante italiano de Nova York
Bons ingredientes tornam filme saboroso
NINA HORTA
COLUNISTA DA FOLHA
No fim do filme alguém diz:
"A vingança é um prato melhor servido frio". Se "Hamlet" é
uma tragédia de vingança, esta é
uma leve comédia do mesmo gênero. Um bookmaker é assassinado por dois mafiosos caricatos.
Seu sócio (Danny Aiello), também bookmaker, assiste a tudo,
quieto. Ele é Louis, em vias de reformar-se e também dono do Gigino, restaurante italiano, em Tribeca, o grande sucesso do momento. Só dono.
Até pela expressão corporal, pode-se adivinhar que ele gosta mesmo é de comida da nonna ou da
mamma. "Quero qualquer coisa
que me alimente, tradicional,
substanciosa." E o cozinheiro é o
filho, o frágil Udo, de cabelinho
moderno, espetado, adepto ferrenho da nouvelle cuisine italiana
que está atraindo as massas.
Quer herdar o restaurante já...
Trata a brigada com o chicote da
língua ferina típica do chef estressado. Só admite três respostas de
seus subordinados latinos: "Sim,
chef", "não, chef" e "não sei,
chef".
A cozinha é a principal protagonista, nervosa, ativa, tresloucada
mesmo, vibrante, facas sem fio,
facas com fio, o calor que esquenta frigideiras e almas, o purgatório
das almas penadas, o buraco por
onde se entra para o fogo eterno.
Clara, iluminada, todos os detalhes aparentes.
O subchefe é bom, mas jogador
compulsivo, protegido do dono,
deve US$ 13 mil à dupla de mafiosos que está no restaurante à espera de pagamento. Enquanto cozinha, escuta os jogos no radinho
de pilha e esbraveja e torce, desatinado.
A adrenalina da cozinha se espalha pela copa. A maîtresse é
oriental, competente e dorme
com o chef e o subchef. Garçons e
garçonetes sobem e descem escadas sem parar, lutam por comandas, sentem que aquele dia é especial sem saber o porquê. A bruxa
anda solta e murmuram sottovoce: "Champagne para a polícia e
jantar para os bandidos!".
O bartender ganha a vida respondendo perguntas de algibeira
por US$ 1 cada uma, enquanto sacode os coquetéis e serve a bebida.
O salão é formado pelas pessoas
que se aglomeram à porta, apesar
da necessidade de reservar com
três meses de antecedência e dos
clientes daquela noite. O ambiente é escuro e aconchegante, uma
cantina bonita, que respira sucesso, boa comida, bom vinho e futilidade nova-iorquina.
Nas mesas: um detetive de polícia, convidado do patrão, com sua
mulher; dois mafiosos que esperam o pagamento do subchef e
querem partilhar dos lucros de
Louis fazendo-lhe uma daquelas
propostas: ou divide conosco ou
morre; uma crítica gastronômica
"disfarçada" com uma enorme
peruca acompanhada de outra
mulher que entra em êxtase com a
comida do chef... e com o chef. A
aflição de Udo, o cozinheiro para
agradar a crítica emperucada é
que nos mostra o preparo ansioso
de uma lagosta de três andares e
um macarrãozinho com trufas.
Mais um sestroso crítico de arte
com seus discípulos e no bar um
bonitão elegante de gravata listrada, gravata que trai seu emprego
em Wall Street, e que observa tudo, divertido.
Quando as luzes se apagam e
imediatamente são providenciadas velas, ele murmura: "Quando
será que comer passou a ser uma
produção da Broadway?". A certa
altura é abordado por uma Julia
Roberts mulata, interessante.
Estes são os protagonistas, e o
próprio Louis está sentado a uma
mesa, gerindo as tensões e intrigas com mão de ferro (mas que
também sabe acarinhar), entrando em choque com a comida feita
pelo filho, empaturrando-se com
o prato que pediu ao subchef,
uma linguiça com pimentão passada na frigideira. Ao seu lado, o
advogado.
O enredo vai se enredando noite adentro, entre os convidados,
os clientes, a cozinha, a copa. A
comida parece excelente, o vinho
também, a maîtresse arranja um
tempinho para dormir novamente com o subchef, o subchef compulsivo aposta alto. Nada acontece até que...
Acho triste que todo filme de
comida seja comentado como delicioso, um prato gostoso, mas resistir, quem há de? Este é feito
com poucos ingredientes simples
e bons, jogados na frigideira
quente, salteados pelo diretor que
é muito hábil, um pouquinho de
pimenta e sal e nada mais. No final, é flambado espetacularmente, e o prato pronto é digerido
com facilidade, sem bicarbonato
ou sal de fruta. É um bom filme
que diverte.
Uma Receita para a Máfia
Dinner Rush
Produção: EUA, 2000
Diretor: Bob Giraldi
Com: Danny Aiello, Edorado Ballerini,
Vivian Wu, Mike McGlone
Onde: em cartaz no cines Frei Caneca
Unibanco Arteplex, Cinearte e circuito
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