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SHOW/CRÍTICA
Três gerações da família Assad são reunidas em espetáculo com músicas de Pixinguinha e Egberto Gismonti
Quando o passado ensina a ouvir a vanguarda
ARTICULISTA DA FOLHA
Os irmãos Assad começam
por onde os outros nem teriam coragem de terminar. Sexta-feira, no Sesc Vila Mariana, entraram em campo, o juiz apitou e
eles atacaram direto o "Baião Malandro", de Egberto Gismonti (do
disco "Carmo", de 1977). Mal cabe no piano, quanto mais em dois
violões. Mas os Assad são craques
nesse tipo de adaptação e tocam
fusas para cima e para baixo como se não fosse nada.
Mais bonito que tudo não é a rapidez, mas o tempo. Quando uma
canção começa, já se está noutro
domínio da vida. Seja tocando em
duo, seja com a irmã Badi (outra
violonista excepcional, além de
excepcional cantora), os filhos estreantes Clarisse (piano e voz),
Carolina (voz) e Rodrigo (voz,
violão), e os estreantes pais, Jorge
(bandolim) e Ica (voz), os irmãos
Sérgio e Odair regem as coisas de
dentro, até quando não estão no
palco.
Misturas
O espírito vivo da música encanta tudo o que a família faz. São
claras as diferenças, mas o DNA é
dos bons. Quem ainda não tinha
ouvido Badi, por exemplo, terá ficado de queixo caído: uma odalisca pós-moderna, entoando multifônicos com delicadeza e dedilhando lindamente o violão. De
pé (ela) ou deitado (ele). Nesse último caso, trespassado por uma
barra sob as cordas, o violão
transforma-se numa cítara, de afinação aberratória; e Badi canta
seus acalantos enquanto pinça
sóis bem temperados, à sombra
dos caracóis do seu cabelo.
Com as duas sobrinhas, cantou
"Jóia", genial miniatura de Caetano Veloso (de 1975). À capela,
cheia de harmonias dissonantes
sustentadas. Nesse tipo de recuperação do cancioneiro (chegando até coisas como a valsa "Rosa",
de Pixinguinha, de 1937, e "Doce
de Coco", de Jacob do Bandolim,
1967, mais Edu Lobo, Chico etc.)
está a razão de ser do projeto,
combinado com a apresentação
da moçada -uma bela canção da
fluente pianista Clarisse, inspirada nos arpejos do segundo movimento do "Concerto n. 2" de
Rachmaninoff, e um funk anos 90
de Rodrigo, entre outras.
O difícil é dar liga na mistura.
Em parte, ela é extramusical: tudo
foi feito também para congregar a
família, convergindo para os
grandes números finais, com o
lindo casal de avós mandando ver
junto com os netos. Seu Jorge de
chinelos, orgulhoso dos filhos, solando o bandolim sem pretensão.
E dona Ica ao lado: "traça tudo",
como ela mesma cantou, com
maroto sorriso e vibrato.
Mas afinal, se a música aqui serve à família, tanto ou mais do que
o contrário, isso vira virtude. Nada foi feito à pressas, os ajustes de
repertório são previsíveis, e a família fazendo música é uma beleza.
(ARTHUR NESTROVSKI)
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