São Paulo, sábado, 20 de outubro de 2007

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Panorama mostra arte da gambiarra

Exposição no MAM chega à 30ª edição, reunindo obras que refletem sobre o improviso e a precariedade na produção

Com curadoria de Moacir dos Anjos, grande parte dos trabalhos aborda questões estruturais como o silêncio e falhas na comunicação

Luigi Stavale/Divulgação
Obra "A Mudança' do artista baiano Marepe, que participou da 27ª Bienal de São Paulo em 2006, e agora está na mostra do MAM

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Durante os próximos dois meses, um palhaço entristecido estará sentado na grande sala expositiva no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM). Ao contrário do que se espera de um palhaço, ele não estará buscando divertir ninguém, mas apenas tocando uma buzina. Seu sinal será mais um ruído em meio a tantos outros.
Esta ação performática é a obra "Palhaço com Buzina Reta - Monte de Irônicos", de Laura Lima, um dos 37 trabalhos que compõem o 30º Panorama da Arte Brasileira. Num momento de crescente inserção das artes plásticas no universo do entretenimento e de maior participação da arte brasileira no circuito internacional, a obra contradiz a expectativa que se tem dessa festa, como se algo estivesse errado no banquete.
A cada dois anos, o MAM convoca um curador para dar sua leitura da produção contemporânea nacional com o Panorama. Na edição deste ano, é a vez de Moacir dos Anjos, até 2006 diretor do Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, no Recife. Como poucas mostras no país possuem um caráter reflexivo sobre a produção atual, cada Panorama tem a potencialidade de provocar novos desafios para a compreensão do que se pode denominar arte brasileira.
Com o título "Contraditório", dos Anjos busca apontar como "a arte não está apenas voltada para ela, mas reflete no campo do simbólico as condições atuais do país". E sua visão, como se observa pela obra de Lima, não é nada otimista.
"Nos anos 60 e 70, os artistas tinham um visão utópica. Hoje estamos cansados, há uma dificuldade imensa em criar formas justas de convivência", disse o curador à Folha, anteontem, durante a montagem da exposição. A tese é próxima ao que se viu no ano passado na 27ª Bienal de São Paulo, intitulada "Como Viver Junto".

Silêncio e descaso
Sem apresentar obras que retratem miséria social ou violência, grande parte dos trabalhos no Panorama abordam questões mais estruturais como a dificuldade do diálogo, o silêncio e o descaso. É o caso, por exemplo, de "Títulos", de Matheus Rocha Pitta, composta por pilhas de rolos de filmes destruídos no Museu de Arte Moderna do Rio, que se tornam um monumento ao descaso com o patrimônio cultural do país. Ou então, "Puzzling Over", de Marilá Dardot, quebra-cabeças de folhas em branco, que podem representar a dificuldade de construir algo.
Dardot e Pitta, aliás, são ambos de Minas Gerais e, dos 28 artistas da mostra, oito são mineiros, o que mostra a importância que a produção daquele Estado vem assumindo. Outra mineira na mostra é Rivane Neuenschwander, que apresenta uma obra que expôs na Bienal de Veneza, há dois anos. A instalação é composta por máquinas de escrever com todas suas teclas apenas com o sinal de ponto. Com isso, qualquer texto que se escreva será sempre apenas do conhecimento de seu autor, novamente aqui uma metáfora da impossibilidade de comunicação.
Dos Anjos chama de gambiarra a precariedade que marca as obras no Panorama, nomeando tal procedimento como conceito que dê conta da produção atual. Utilizada já por vários críticos e curadores para explicar obras e trabalhos brasileiros, o curador não o utiliza apenas para descrever os materiais usados, mas também para tratar de temas abordados e táticas de sobrevivência. Dentre os trabalhos que abordam essa questão, "Duas Paralelas que Não se Encontram no Infinito" e "Isolante", de Marcius Galan, são bastante exemplares, pois são obras que se utilizam de materiais precários em sua construção, mas também tratam da subversão de seus significados.
Na abertura da mostra, hoje, às 13h, o coletivo carioca Chelpa Ferro fará uma nova performance. Na exposição, eles apresentam "On-off poltergeist", composta por cinco televisores ligados, mas com o áudio trocado.


PANORAMA DA ARTE BRASILEIRA 2007
Onde: MAM-SP (pq. Ibirapuera, portão 3, SP, tel. 5085-1300)
Quando: abertura, hoje, 11h; de ter. a dom., das 10h às 18h; até 06/01
Quanto: R$ 5,50 (entrada franca aos domingos)



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