São Paulo, sábado, 20 de outubro de 2007

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Crítica/"Vocês, os Vivos"

Filme sueco é um "ocni", objeto cinematográfico não-identificado

PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA

Não há nada muito parecido por aí com "Vocês, os Vivos", de Roy Andersson.
Um dos grandes destaques da mostra "Um Certo Olhar" do Festival de Cannes deste ano (só não participou da competição, porque não ficou pronto a tempo e foi incluído na programação a posteriori), o filme poderia ser classificado como um "ocni" -objeto cinematográfico não-identificado-, sigla que alguns críticos gostam de usar para (não) definir obras originais e estranhas.
Apesar de sueco, Andersson nada tem de Bergman. Se há paralelos possíveis com outros diretores, eles estariam no humor do finlandês Aki Kaurismaki e no estilo do francês Jacques Tati. Mesmo assim, são parentescos distantes.
Andersson é um diretor bissexto. Fez apenas dois longas na década de 70 (hoje desconhecidos, apesar de o segundo, "Uma História de Amor Sueca", ter passado na competição do Festival de Berlim) e ficou 15 anos sem filmar.
Em 2000, voltou à cena com o igualmente bizarro "Canções do Segundo Andar", que levou o Prêmio do Júri em Cannes (e também está em exibição especial nesta Mostra). "Vocês, os Vivos" segue a mesma lógica de "Canções...": são esquetes independentes entre si, filmados em um plano único, cada um contando uma historinha ou "gag" fechada.
Em comum entre eles está a câmera estática, a luz fria e o visual estilizado, de tons predominantemente marrons e cinza. Aqui, mais do que em "Canções...", Andersson acentua o humor e a utilização da música.
Os esquetes quase sempre se situam em cenários do cotidiano como escritórios, apartamentos, bares ou restaurantes. Muitas vezes são filmados como "tableaux" que se parecem com "cartoons"; outras, ganham tom fantástico, delirante. As situações, em geral, exploram aspectos patéticos do ser humano, mas Andersson consegue fazer isso sem cair em um tom depreciativo.

Grandeza da existência
Uma mulher termina com seu namorado, um homem ensaia com uma tuba, outro narra um sonho estranho, e por aí vai. Quando vemos, está lá o filme inteiro, divertido, estranho, e dono de um sentido muito particular. "Vocês, os Vivos" tem como "tagline" uma definição irônica: "Um filme sobre a grandeza da existência". Mas, apesar da pequenez das situações que descreve, Andersson acaba transmitindo algo de realmente grandioso, escondido nas entranhas de uma fórmula aparentemente simples.


VOCÊ, OS VIVOS
Direção: Roy Andersson
Produção: Suécia/Alemanha/França/Dinamarca/Noruega
Com: Jessica Lundberg, Elisabet Helander, Björn Englund
Quando: amanhã, às 20h40 no Unibanco Artplex; seg., às 17h30, no Cine Bombril; qui., às 16h10, no Reserva Cultural; sexta, às 20h20, no Cinesesc
Avaliação: ótimo



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