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São Paulo, sábado, 21 de junho de 2003

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MÚSICA ERUDITA

Tan Dun, compositor chinês, rege arrojado programa apenas com três obras suas, na Sala São Paulo

A Osesp sem medo de ser vanguarda

ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA

"Ninguém gosta de música contemporânea." "É só para iniciados." Quem não vai a concertos continua dizendo essas coisas. Enquanto isso, a Sala São Paulo encheu de gente, em pleno feriadão, para escutar a Osesp tocando um programa só de obras do compositor chinês Tan Dun (1957), regidas pelo próprio.
Em 2001, na mesma sala, a Filarmônica de Nova York já havia tocado seu "Concerto para Aquapercussão e Orquestra". Aquapercussão: cubas d'água, aquafone (espécie de viola, tocada com arco), tubos e cuias que se põem na água alterando seu som. A mesma peça fechou o programa anteontem, interpretada pelo espetacular David Cossin, acompanhado pela orquestra, que obviamente estava gostando, para não dizer que estava se divertindo.
A platéia também. Sem nenhum demérito, é música fácil de gostar. E não apenas pelo fascínio dos instrumentos novos e dos efeitos sonoros inusitados.
Nessa como nas outras peças (dois episódios do "Teatro Orquestral"), Tan Dun combina elementos da música tradicional chinesa com outros tantos da música ocidental de vanguarda, num ambiente dramático. Silêncios ganham eloquência. Sons isolados vão se alterando aos poucos, ensinando o ouvido a ser zen. Golpes da orquestra inteira sugerem os rasgos de um pincel de calígrafo, criando mil sentidos e cores de uma vez. Melodias quase folclóricas aparecem aqui e ali, com seus encantamentos pentatônicos.
O tempo se alterna entre os lentos densos e os andantes leves, chegando aos vivos "mecânicos", à la Stravinski; noutro extremo, abre espaço para ocasionais "cadenzas" e improvisações.
Dun começou na ópera ("Marco Polo", 1995); e sua música tem sempre um sentido apurado de drama. Nunca escreve menos do que bem; ouvintes pouco generosos dirão que também não passa disso. Será pouco? Na literatura, sugere equivalências com romancistas como Martin Amis, Milan Kundera, Umberto Eco.
Nem toda boa orquestra é uma orquestra boa para tocar música contemporânea. A Osesp vem se revelando uma amiga dos novos e estava afiada sob a regência do ágil, preciso e sempre simpático compositor. Em "Orchestral Theater 2", que exige a participação de músicos espalhados pela sala, sem falar na platéia (que canta "hummmmm" e entoa um mantra), Dun foi bem auxiliado por Wagner Politschuk, trombonista da Osesp, atual regente titular da Sinfônica da Universidade Estadual de Londrina.
"Simpatia" e "maestria" são palavras que ocorrem, para um concerto assim. Talvez até "alegria". Certamente ninguém sai triste, ou entediado. Quem diria! Era música contemporânea. Grande sucesso, grande precedente; já se sabe quem vem em 2004?


Tan Dun
    
Onde: Sala São Paulo (pça. Júlio Prestes, s/nš, tel. 3337-5414)
Quando: hoje, às 16h30
Quanto: de R$ 16 a R$ 52



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