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"RETORNARSE"
Encenada na Casa nš 1, peça da Companhia Auto-Retrato não se quer como objeto estético, mas processo
Grupo se intimida com a própria ousadia
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Apresentado como pesquisa em torno do movimento e
da memória pessoal, "Retornarse" não chega a se constituir em
um espetáculo de teatro-dança,
apesar da precisão e do preparo
das atrizes que se expressam através de coreografias e monólogos
nos quais evocam sua infância.
A ênfase no improviso, reforçada pela disposição espacial -os
espectadores sentam em almofadas em redor de uma sala comum, segundo a estética dominante dos espetáculos da Casa nš
1-, dá a sensação de estar em
uma festa na casa de alguém.
Assim, ávidas e breves confissões pessoais são entremeadas
por longos momentos nos quais a
angústia não dita se expressa em
dança. Olho no olho, em flerte
aberto com cada um na platéia,
vai se criando a promessa de uma
entrega final -ou não.
Apesar de uma elegia inicial à
infância, quando uma atriz apresenta fotos de si mesma menina e
manifesta o desejo de se manter
assim, preservada em um presente eterno, o tom que domina é de
desencanto, como se a entrada no
mundo adulto não revelasse a dor
e a delícia de ser o que se é, mas o
desapontamento por não se tornar nada além do que sempre se
foi.
Processo
Sem nenhum apelo panfletário:
retornar-se não é revoltar-se. Não
há auto-indulgência, não se trata
aqui de uma pseudoterapia na
qual se passa à platéia o ônus de
endossar uma mistificação de si
mesmo.
A própria estratégia de auto-exposição, levada ao máximo na cena final, é uma constatação de um
beco sem saída. As atrizes se negam à delícia de se tornar outro e,
redundando na mera presença,
despem-se de todo sentido.
É difícil avaliar esteticamente a
experiência, dado que não se propõe a ser um objeto estético, mas
o compartilhar de um processo. A
crueza da proposta chega ao desconforto, e parece ser essa mesma
a intenção.
No entanto, há uma insegurança na execução, uma timidez
diante da própria ousadia que faz
acreditar que a companhia Auto-Retrato está ainda no meio do caminho: não se pode mais ignorá-la, mas já se espera mais dela.
Retornarse
Texto: Caetano Gotardo
Direção: Maurício Veloso
Com: Companhia Auto-Retrato
(Gabriela Schwab, Marina Corazza,
Marina Tranjan, Thaís Almeida Prado e
Thaís Rapini)
Onde: Casa nš 1 (r. Roberto Simonsen,
136-B, região central, tel. 3241-3132)
Quando: de sex. a dom., às 20h; até 29/6
Quanto: R$ 10 (amanhã, entrada franca)
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