Drama policial de estreante é espécie de "Twin Peaks" filmado no interior de SP

Divulgação

Cena de "Cana Quente", drama ambientado no interior de SP

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Luiz Alberto Zakir, ex-gerente do Cinesesc, faz sua estréia na direção com "Cana Quente", um drama policial, social, moral e político ambientado na cidade de Ribeirão Bonito, na região canavieira do interior de São Paulo.
O nó do enredo do filme é o assassinato de uma garota assanhada do interior, pobre e anônima, depois de um bailão. Um dos principais suspeitos é um certo Índio (Hugo Cesarini), cortador de cana recém-chegado à cidade que tem fama de galã conquistador.
Desse fiapo de ação, Zakir traça uma crônica dos costumes da cidade e, pelas bordas, das relações de poder locais.
Usineiros, cortadores de cana, policiais, violeiros, mulheres casadas insatisfeitas, matadores de aluguel, todos esses personagens agem diante da câmera como se estivessem num documentário ou num grande filme doméstico.
É um drama ao mesmo tempo estranho e familiar, sem suspense, sem tensão, como se toda agitação humana acabasse absorvida pela leseira daqueles grandes espaços escaldados pelo sol.
Contribui para essa sensação a narrativa distendida, de planos longos e abertos, que dispensa o recurso ao contracampo e à música (com exceção da executada em cena).
Atores e não-atores se misturam em um mesmo cenário, e nem uns nem outros "representam". São quase "mode- los", no sentido bressoniano da palavra.
Está aí uma aproximação possível: é como se "Cana Quente" fosse uma espécie de "Twin Peaks" [série de TV de David Lynch] caipira filmado por Robert Bresson: o anômalo submetido a uma depuração estilística quase mineral.
O baixo orçamento e a independência da produção não impedem que o filme tenha uma fotografia belíssima, assinada por Aloysio Raulino, que capta com rara sensibilidade a luz da chamada "terra roxa".

Avaliação: bom


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