São Paulo, terça-feira, 24 de outubro de 2006

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Grupo francês barroco toca Mozart

O regente, Marc Minkowski, apresenta as últimas duas sinfonias do compositor e prepara "ciclo sinfônico" de Beethoven

Minkowski, fundador do grupo, quer lançar em CD o repertório escolhido para SP e diz que Haydn era melhor, "na média", do que Mozart


Divulgação
O grupo Les Musiciens du Louvre, que se apresenta hoje e amanhã, no Cultura Artística, com instrumentos e afinação barroca


JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Les Musiciens du Louvre tornaram-se em 24 anos uma importante referência musical francesa no repertório barroco mundial. Com instrumentos e afinação de época, aproximaram-se mais recentemente de Mozart, que compõe o programa que encerra hoje e amanhã a temporada internacional da Sociedade de Cultura Artística.
O fundador e artífice da orquestra é o ex-fagotista e musicólogo Marc Minkowski. Ele é sobretudo um pesquisador e regente ousado. Sua arqueologia nos desenterra um Mozart sinfônico rejuvenescido, com novos equilíbrios entre as cordas graves e agudas, como na "Sinfonia nš 41" (a conhecidíssima "Júpiter"), que integra seu último CD e também está no programa de São Paulo. Eis trechos de sua entrevista.
 

FOLHA - Por que o sr. escolheu para o programa da turnê as duas últimas sinfonias de Mozart, e não as iniciais ou intermediárias? MARC MINKOWSKI - Primeiro, porque acredito que sejam as mais belas. O Mozart jovem não me interessa tanto assim. Estamos agora gravando as integrais das sinfonias que Haydn compôs em Londres, e dá para perceber o quanto Haydn era superior à média de Mozart. Em Mozart, as sinfonias verdadeiramente "sublimes" estão a partir da 31 ou da 34 em diante. Antes disso, há tentativas de um prodígio, mas não ainda de um gênio.

FOLHA - Em sua recente gravação das sinfonias 40 e 41 há uma ênfase nas cordas graves, na sonoridade dos violoncelos e contrabaixos. É uma "liberdade poética"?
MINKOWSKI -
De modo algum. Eu as interpretei conforme elas estavam escritas. O que me surpreende é que, em geral, não haja essa mesma ênfase dos sons graves nas gravações até agora feitas. Na época de Mozart não se utilizavam prioritariamente os violinos.

FOLHA - O realce dos sons graves dá, então, uma idéia de profundidade, bem distante do simples entretenimento musical?
MINKOWSKI -
No momento em que fazemos Mozart e nos aproximamos dele com instrumentos utilizados no final do século 18, precisamos também atentar para o fato de que, na época dele, os contrabaixos eram às vezes mais numerosos que os violinos. O anormal seria aderir à síndrome da orquestra de câmara em que contrabaixos e violoncelos se reduziriam a um papel miserável, escravizados pelos violinos.

FOLHA - Por que a música com instrumentos e afinação de época demorou tanto para chegar à França?
MINKOWSKI -
Isso não é bem verdade. A França teve na primeira metade do século passado a cravista Wanda Landowska, por mais que ela fosse polonesa e depois emigrasse para os Estados Unidos. Em seguida tivemos Jean-Claude Malgoire, ainda na ativa, e que gravou nos anos 70 as grandes óperas de Händel. Mas é talvez possível que a exigência de qualidade tenha chegado mais tarde.

FOLHA - Será que não havia também o conservadorismo do Conservatório Nacional?
MINKOWSKI -
Com certeza. Ainda hoje há menos cursos de música barroca com essa estética [em Paris] que em Londres ou Amsterdã. A resistência persiste.

FOLHA - O sr. declara com freqüência que Toscanini e Furtwängler, dois maestros da primeira metade do século 20, são seus mestres. Mas eles encaravam o barroco de um modo hoje visto como anacrônico.
MINKOWSKI -
O que eu admiro neles é a imensa liberdade com que regiam, a energia, sem abandonar o profundo respeito pela partitura. São coisas fundamentais que me inspiram.

FOLHA - As sinfonias de Beethoven estão em seus planos?
MINKOWSKI -
Estamos nos preparando para um grande ciclo sinfônico de Beethoven dentro de dois ou três anos.

FOLHA - E como conceber uma "interpretação de época" com as quatro sinfonias de Brahms?
MINKOWSKI -
Por que não? Brahms exige uma grande orquestra. Mas muitas vezes ele trabalhava com apenas dez primeiros violinos, em lugar dos 16 ou 18 hoje habitualmente escalados pelas orquestras. Isso daria uma outra sonoridade.


MUSICIENS DU LOUVRE
Quando:
hoje e amanhã, às 21h
Onde: Teatro Cultura Artística (r. Nestor Pestana, 196, tel. 3258-3344)
Quanto: de R$ 80 a R$ 180


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