São Paulo, quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

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Texto de Novarina brinca com a língua

"Inquietude" traz personagem com discurso mais sonoro do que racional

Dramaturgo é hoje um dos autores contemporâneos mais encenados na França; peça é a segunda parte de "Discurso aos Animais"

GABRIELA MELLÃO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Samuel Beckett criou novos paradigmas para a arte teatral. Valère Novarina, dramaturgo francês que é hoje um dos autores contemporâneos mais encenados em seu país, segue os passos de Beckett. Entretanto, como se pode notar em "A Inquietude", monólogo de sua autoria com interpretação de Ana Kfouri e direção de Thierry Trémouroux, em vez de fazer um uso minimalista da linguagem, como seu predecessor, trabalha a língua de forma exagerada, transformando-a num jogo sem regras ou lógica, no qual tudo é permitido, até brincar com a sintaxe. "No lugar de apurar a língua francesa, de procurar seu centro, como Beckett, eu a semeio, a espalho, algumas vezes a violento também, a faço germinar para todos os lados e sentidos", disse Novarina na estreia de "O Animal do Tempo", primeira parte do texto "Discurso aos Animais", apresentado por Kfouri em 2007, que se completa com "A Inquietude". "A Inquietude" se desenvolve na fala poética de João Mancada. O personagem é um tipo despersonalizado, que conversa com animais. Seu discurso, mais sonoro do que racional, estimula o público a libertar-se de significados. "Novarina quer atingir o sistema nervoso do espectador, e não seu cérebro", diz Kfouri, atriz e diretora que dedica-se à investigação cênica. "Sua obra, tecida por buracos e intensidades, foge da mesmice, do fechamento de sentidos, apontando novas possibilidades à cena", completa. O palco é revestido por um tecido que cobre o chão, com algumas bolas de luz espalhadas, e a parede do fundo, remetendo ao espaço lunar. Sugere ao espectador uma viagem por um universo estrangeiro. O espaço é móvel, começa amplo, distante do espectador, e aproxima-se dele na medida em que Kfouri se move em direção à plateia. Faz o mesmo percurso da dramaturgia de Novarina no corpo dos espectadores: inicia-se com grande estranhamento, impenetrável, e através de frases familiares que despontam aqui e ali, revelando vestígios comuns da vida humana, cria íntima conexão com a plateia.


A INQUIETUDE
Onde: Sesc Avenida Paulista (av. Paulista, 119, tel. 3179-3700)
Quando: qua. e quin., às 21h; até 25/03
Quanto: de R$ 5 a R$ 20
Classificação indicativa: 14 anos




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