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Texto de Novarina brinca com a língua
"Inquietude" traz personagem com discurso mais sonoro do que racional
Dramaturgo é hoje um dos autores contemporâneos mais encenados na França; peça é a segunda parte de "Discurso aos Animais"
GABRIELA MELLÃO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Samuel Beckett criou novos
paradigmas para a arte teatral.
Valère Novarina, dramaturgo
francês que é hoje um dos autores contemporâneos mais encenados em seu país, segue os
passos de Beckett.
Entretanto, como se pode
notar em "A Inquietude", monólogo de sua autoria com interpretação de Ana Kfouri e direção de Thierry Trémouroux,
em vez de fazer um uso minimalista da linguagem, como
seu predecessor, trabalha a língua de forma exagerada, transformando-a num jogo sem regras ou lógica, no qual tudo é
permitido, até brincar com a
sintaxe.
"No lugar de apurar a língua
francesa, de procurar seu centro, como Beckett, eu a semeio,
a espalho, algumas vezes a violento também, a faço germinar
para todos os lados e sentidos",
disse Novarina na estreia de "O
Animal do Tempo", primeira
parte do texto "Discurso aos
Animais", apresentado por
Kfouri em 2007, que se completa com "A Inquietude".
"A Inquietude" se desenvolve na fala poética de João Mancada. O personagem é um tipo
despersonalizado, que conversa com animais. Seu discurso,
mais sonoro do que racional,
estimula o público a libertar-se
de significados. "Novarina quer
atingir o sistema nervoso do espectador, e não seu cérebro",
diz Kfouri, atriz e diretora que
dedica-se à investigação cênica.
"Sua obra, tecida por buracos e
intensidades, foge da mesmice,
do fechamento de sentidos,
apontando novas possibilidades à cena", completa.
O palco é revestido por um
tecido que cobre o chão, com algumas bolas de luz espalhadas,
e a parede do fundo, remetendo
ao espaço lunar. Sugere ao espectador uma viagem por um
universo estrangeiro. O espaço
é móvel, começa amplo, distante do espectador, e aproxima-se
dele na medida em que Kfouri
se move em direção à plateia.
Faz o mesmo percurso da
dramaturgia de Novarina no
corpo dos espectadores: inicia-se com grande estranhamento,
impenetrável, e através de frases familiares que despontam
aqui e ali, revelando vestígios
comuns da vida humana, cria
íntima conexão com a plateia.
A INQUIETUDE
Onde: Sesc Avenida Paulista (av. Paulista, 119, tel. 3179-3700)
Quando: qua. e quin., às 21h; até 25/03
Quanto: de R$ 5 a R$ 20
Classificação indicativa: 14 anos
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