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Crítica/ "Pachamama"
Documentário é "Avatar" realista sobre América Latina
Longa investiga tradições e tendências da região entre os Andes e a Amazônia
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
A palavra "Pachamama",
título do novo documentário de Eryk Rocha, significa, numa mistura
das línguas quíchua e aimará
com o castelhano, "mãe terra".
É em busca dessa terra ancestral, de uma América profunda
situada entre os Andes e a Amazônia, que o filho de Glauber
Rocha se lança com sua pequena equipe, em dois jipes saídos
do Rio no início de 2007. Seu
destino é a região da tríplice
fronteira entre o Brasil, o Peru
e a Bolívia.
Mas o que move a câmera curiosa e inquieta do diretor não é
um interesse etnográfico ou
passadista, mas a descoberta
das forças vivas em ação hoje,
vistas como resultado de cinco
séculos de confluências e conflitos entre os povos que ocuparam a região.
Embora a própria voz do diretor narre a saga em primeira
pessoa, e a equipe de filmagem
seja ocasionalmente interpelada pelos retratados, "Pachamama" foge do narcisismo e da
metalinguagem. Seu traço básico é a porosidade, a permeabilidade ao ambiente natural e humano em que se aprofunda.
Pontuam a narrativa imagens de paisagem em movimento (como mato na contraluz, cintilações do sol num lago,
chuva no vidro do carro), que
tendem para um grafismo não
figurativo que já é uma marca
de estilo do diretor.
Com o mesmo cuidado, a câmera perscruta índias peruanas tecendo mantas e o acirrado debate durante uma reunião
de ativistas; um discurso de
Evo Morales em defesa da produção cocaleira e a algaravia
numa feira de rua em Cuzco; as
tradições milenares e as tendências atuais.
Os discursos se inflamam, se
chocam. Há os que defendem a
volta a um passado mítico pré-colombiano, há os que pregam
uma modernização capitalista.
O filme dá voz a todos, expondo
fraturas sociais e contradições
políticas, traduzidas aqui e ali
em confrontos violentos.
Essa polifonia, essa abertura
ao que é, não exclui o esboço de
uma perspectiva sobre o que
poderia ser: um continente
multicultural que respeitasse a
natureza e a história de seus
povos. Em suma, uma espécie
de "Avatar" adulto e realista.
PACHAMAMA
Direção: Eryk Rocha
Produção: Brasil, 2008
Onde: estreia amanhã, no Cine Bombril,
Espaço Unibanco e Unibanco Arteplex
Classificação: livre
Avaliação: bom
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