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ARTE
Performance reúne mulheres em dia contra a violência doméstica
150 "noivas" despetalam buquês na Paulista
Adriana Zehbrauskas/Folha Imagem
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Mulheres ensaiam para evento que será hoje na avenida Paulista |
CASSIANO ELEK MACHADO
JULIANA MONACHESI
DA REPORTAGEM LOCAL
Atenção: isto não é um casamento. Não vai haver marcha
nupcial nem noivo. Só 150 vestidos de noiva andando junto com
o mesmo número de mulheres
pela avenida Paulista.
Trata-se de uma performance
que Beth Moysés concebeu para a
tarde deste sábado. "É como uma
passeata de formigas brancas",
brinca a artista. "Sabe quando você coloca o dedo na frente da fila
de formigas e elas embolam? Vamos fazer isso a cada farol."
A opção de parar nos faróis foi
tomada para não infringir nenhuma lei, reforçando o caráter pacifista da performance, que acontece no Dia Internacional da Não
Violência Contra a Mulher. Cada
uma vai carregar um buquê de rosas, que irá despetalando em silêncio, deixando um rastro de pétalas brancas na avenida.
"O vestido de noiva é um símbolo da fantasia, do sonho da mulher", afirma Beth Moysés, que
utiliza a roupa há anos como suporte de seus trabalhos. Começou
como uma alternativa simbólica à
lona: a artista esticava o tecido no
chassi e o pintava.
Em novembro de 1996, Beth
Moysés realizou uma instalação
na Capela do Morumbi com 25
vestidos de noiva, que ela entrelaçou e dispôs no teto do local. "Ali,
eles simbolizavam o sonho inalcançável da mulher. E, devido à
gravidade, os vestidos ficavam inflados, parecendo nuvens."
Na exposição seguinte da artista, na galeria Thomas Cohn em
1998, os vestidos voltaram, mas
desta vez forrando o chão. As pessoas podiam andar descalças sobre a instalação, sentido as pérolas sob os pés. "No chão, os vestidos perderam o brilho e murcharam, remetendo à realidade, não
mais ao sonho", afirma.
Com a performance na Paulista,
na qual a artista vem trabalhando
há dois anos, sua poética ganha
um novo rumo: "Esses corpos
agora se recuperam, criam vida,
saem em busca de mudança". A
escolha do local não foi aleatória.
"Essa avenida com tamanha concentração financeira é o cenário
ideal para repensar o afeto."
Beth Moysés insiste no caráter
artístico do ato. "Uma passeata teria conotação meramente política, e a intenção é fazer algo poético." Os vestidos são todos "desativados", como a artista os chama.
"Todos têm memória de muitos
casamentos", pois foram coletados em lojas de aluguel da rua São
Caetano. Alguns, inclusive, estavam na instalação de 1996.
As mulheres partem da rua da
Consolação com a avenida Paulista às 16h e caminham até a praça
Oswaldo Cruz, em frente ao shopping Paulista, um dos patrocinadores do evento, que recuperou o
canteiro da praça.
Nesse canteiro, foi cavado um
buraco para os resíduos dos buquês serem depositados ao final
da performance. "Os espinhos,
que são o que vai sobrar das rosas,
serão jogados no canteiro e enterrados", explica a artista.
Das 150 mulheres que foram recrutadas junto a organizações
não-governamentais ligadas à
questão da mulher, muitas foram
vítimas de violência doméstica ou
conviveram em um lar violento.
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