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MÚSICA
Orquestra Jazz Sinfônica toca 18 "Prelúdios" de Debussy em versão do maestro Rogério Duprat, gravada ao vivo
Virtudes e frustrações de um orquestrador
ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA
Orquestrar Debussy: um
arrojo, um acinte, uma barbaridade. Um bom começo, de
qualquer modo; ainda mais
quando o orquestrador é Rogério
Duprat -são Rogério Milagreiro, de "Domingo no Parque" e
outros prodígios tropicalistas.
Grande idéia da Orquestra Jazz
Sinfônica, então, de apresentar os
"Prelúdios" de Debussy (1862-1918) na versão sinfônica do compositor carioca, anteontem no Memorial.
Era de se esperar reco-reco, rabeca, sanfona. Mas a orquestração de Duprat não tem nada de tropicalismos. Virtudes e frustrações da partitura têm de ser ouvidos no contexto que ela mesma impõe, explicitamente convencional. Onde se espera flauta ("La Fille aux Cheveux de Lin"), vem a
flauta; onde se esperam sinos ("La Cathédrale Engloutie"), vêm
os sinos.
A dificuldade da empreitada
não é pequena, já que os "Prelúdios" foram compostos com base
na sonoridade do piano; não são
melodias e harmonias que se poderiam tocar em qualquer instrumento, mas sons bem específicos.
Isso implica, por exemplo, reconhecer o papel da ressonância
na articulação da música - que
muda muito quando se passa do
piano à orquestra. Foi o ponto
mais frágil na interpretação da
Jazz Sinfônica, regida por João
Maurício Galindo. A Orquestra
tocou as notas melhor do que os
silêncios.
Curiosamente, os "Prelúdios"
para orquestra soaram bem mais
homogêneos do que no piano.
Talvez a música ainda não estivesse madura a ponto de ser gravada ao vivo. Talvez fosse o desconforto de tocar cercado de microfones e câmeras. Talvez fosse o artificialismo da apresentação,
em formato "simpático", de
show. O fato é que os "Prelúdios",
assim, correm o risco de virar
uma coleção de peças pitorescas,
bibelôs do pré-modernismo.
Falando em pitoresco: menção
especial ao pirata do corne inglês,
de lenço vermelho na cabeça (homenagem a "La Mer"?). Antipitoresco: o uso mínimo de percussão. Estranho: ataque fortíssimo
do trompete com o tema da
"Marselhesa", em "Feux d'Artifices" (indicado "bem de longe",
na partitura original, o que muda
todo o sentido).
Foram ao todo 18 "Prelúdios", 9
de cada livro. Não são muito mais
do que um exercício delicado do
maestro Duprat -o que, aliás,
justifica qualquer concerto. Só ficou faltando mesmo o "Dimanche Dans le Parc", que Debussy esqueceu de compor, e Duprat,
quem sabe, agora, não escreve para ele.
Avaliação:
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